01 janeiro 2004

O malandro arrependido

Ela tinha uma cintura bem torneada
cadeiras cheias
e caçava os machos nos arredores da Madeleine.
pela sua forma de me dizer: Meu anjo
apeteço-te?
eu vi logo que se tratava de uma debutante.

Ela tinha talento, é verdade, eu confesso-o.
Ela tinha génio,
mas sem técnica um dom não é nada.
Certamente não é tão fácil ser puta como ser freira,
pelo menos é o que se reza em latim na Sorbonne.

Sentindo-me cheio de piedade pela donzela
ensinei-lhe os pequenos truques de sua profissão
e ensinei-lhe os meios para fazer logo fortuna
rebolando o lugar onde as costas se assemelham à lua,

Porque na arte de fazer o trottoir, confesso,
o difícil é saber mexer bem o rabo.
Não se mexe o rabo da mesma maneira
para um farmacêutico, um sacristão, um funcionário.

Rapidamente instruída pelos meus bons ofícios
ela cedeu-me uma parte de seus benefícios.
Ajudavamo-nos mutuamente, como diz o poeta:
ela era o corpo, naturalmente, e eu a cabeça.

Quando a coitada voltava para casa sem nada
dava-lhe umas porradas mais do que com razão.
Será que ela se lembra ainda do bidé com
que lhe rachei o crânio?

Uma noite, por causa de manobras duvidosas
ela caiu vítima de uma doença vergonhosa,
então, amigavelmente, como uma moça honesta
passou-me a metade de seus micróbios.

Depois de dolorosas injecções de antibióticos
desisti da profissão de cornudo sistemático.
Não adiantou que ela chorasse e gritasse feita louca
e, como eu era apenas um canalha, fiz-me honesto.

Privada logo da minha tutela, a minha pobre amiga,
correu a suportar as infâmias do bordel.
Dizem que ela se vendeu até aos polícias!
Que decadência!
Já não existe mais moralidade pública
na nossa França!

(de Georges Brassens - "Chansons")

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