Uma das coisas que eu mais gosto em Sófia são os jardins. Alguns deles são bastante grandes, todos a tender para o selvagem. Normalmente com muitas pessoas, algumas a beber cerveja, outras a andar de bicicleta ou de skate, outras a namorar e algumas a pedir esmola. Nunca gostei de jardins demasiado cuidados, com as árvores sempre podadas e os arbustos a delimitarem áreas como se fossem linhas de soldados incapazes de pensar. No que se refere às mulheres também sou assim. Gosto das desarranjadas e digo-o assim por também gostar de pensar em mulheres como jardins.
Talvez por isso me tenha passeado bastantes vezes por eles, tão sozinho quanto o que se pode estar num cidade com três milhões de habitantes em que não se conhece nenhum. Normalmente em Borisova, com uma garrafa de litro de cerveja na mão e o tempo a passar devagar pela minha pele. Uma vez sentei-me num dos velhos bancos a beber e conheci uma mulher que se sentou propositadamente ao meu lado. Ao contrário do jardim, estava bem arranjada. Falámos um pouco e senti-me ainda mais só.
Podemos pensar que é a conhecer pessoas que se combate a solidão, mas não é verdade. É quase isso, ou seja, conhecendo algumas pessoas. As pessoas são como peças de um puzzle. Algumas encaixam em nós, outras não. E é assim que se começa uma história a dois. Encaixando.
Uns dias mais tarde voltei lá e deitei-me na relva. Foi a primeira vez que reparei que as árvores contavam segredos entre elas sobre as pessoas que passavam. Sobre dois velhos, por exemplo, discutiam sobre há quanto tempo eles vão ali passear abraçados. Sobre um adolescente que patinava num skate colorido, apostavam sobre quando ia ser a sua primeira queda. Acho que as árvores sabem tudo sobre nós. É por isso que não falam. Segredam.
E então segredaram-me sobre uma mulher que passava sozinha. Disseram-me que encaixaria em mim e eu levantei-me e fui falar com ela. Primeiro ignorou-me e depois pediu-me que me afastasse. Depois eu disse-lhe onde ia estar deitado na próxima hora, se ela quisesse voltar. E ela voltou. As árvores tinham razão.
Nesse dia dei-lhe a mão e deixei de ouvir os seus segredos.
bagaço amarelo
Blog «Não compreendo as mulheres»