19 novembro 2013

A gente queixa-se do acordo ortográfico mas antes também a língua já era traiçoeira

Verga 
que 
verga 
não é 
verga!

São Rosas

A FODA COMO ELA É (V) - Golo do Benfica

Diz-se vulgarmente que o futebol é causa frequente de agruras para o enlevo conjugal, uma paixão que se manifesta de mão dada com o avançar da monotonia nas relações, etc. Não foi assim com este casal, cuja aventura me foi narrada por um amigo em comum.
Estavam ambos sentados no sofá da sala, diante da televisão, cumprindo a medíocre liturgia dos seus serões de Sábado. Ela passava o tempo lendo uma dessas revistas para a dona-de-casa badalhoca, célebre pelo correio dos leitores, em que pontificavam questões de grossa metafísica, tais como a possibilidade de se engravidar pelo cu. Ele assistia a um entediante Campomaiorense-Benfica, usando de uma paciência beneditina, sem qualquer interesse, não obstante ser benfiquista até debaixo de água. O marasmo espessava a atmosfera sobreaquecida da sala em que os dois vegetavam. Sem prelúdios de oratória, trejeitos físicos, nem desviando a vista da televisão, o fulano atirou casualmente: -"Vamos foder?" Em resposta recebeu um encolher de ombros, um descer de calça de fato de treino Quechua, um ás-de-copas oferecido e uma mão que desviava a cueca para o lado. Era sempre assim: entre eles, os preliminares tinham o encanto de uma repartição de finanças de província perto da hora do fecho. Montou-se o manfio na cachopa e deu início ao costumeiro martelanço, sem tirar os olhos do jogo de futebol. Juram-me que se ouviu um bocejo entre o slop! slop! de carnes. Mas eis que as papoilas saltitantes se agitaram e o Benfica marca um golo. No mesmo instante, o moço - tolo de alegria, a atenção colada ao ecrã com Araldite - retirou o malho da suave gruta e, fazendo o movimento de regresso segundo um ângulo errado, empalou com o caralho o esfíncter à cônjunge, a sangue-frio, enquanto gritava: -"Golo do Benfica!"
Não me contaram os instantes seguintes a tão bárbara invasão aos domínios do rego, mas sabe-se que as colegas de trabalho da menina, lá no call-center, estranharam que nessa segunda-feira ela se sentasse com mil cautelas e ostentasse um constante, misterioso, deliciado sorriso...

«Caminhos» - Susana Duarte

____seguirei sempre as ondas dos teus cílios____

escrevo-te a partir da noite, onde os olhos marejam
cerejas bravas, aquelas que engoli quando partiste.

escrevo-te a partir das sombras onde os cabelos gotejam
lágrimas de sol e de sal e de noite e de feitiços,
e as pálpebras refletiram as coisas todas que viste,
e eu vi; e eu, vi-as em ti: os dias da rubra
penumbra dos leitos dos amantes, ágape
dos corpos, antes que a solidão os cubra.

escrevo-te a partir da noite, onde feiticeiras volteiam
e dançam, como papoilas celebradas, renascidas,
rubras como os lábios, que me deixaste sós, ventre
desmaiado sobre a praia, onde os rumos das aves
são rotas por nascer. desmaio em traves ladeirentas,
que não consigo subir, por entre olhares sonhados:
e eu vi todas as coisas em ti- os dias da amora rubra
voltam a mim como sonho que se demora. ocupas-me

____os dias em que te escrevo, e as noites em que te sinto. ocupas tudo o que sei. como um rio que transborda. como uma maré que seguirei, como as ondas dos teus cílios.____



Susana Duarte
Foto de Ivano Cetta
Blog Terra de Encanto

«Eglise de Brou - la correction maritale»

A correcção marital.
Reprodução, num pequeno prato em estanho com 9,5 cm de diâmetro, de um casal no topo de uma coluna da igreja de Brou, em Bourg-en-Bresse (França).




18 novembro 2013

Em Glasgow sabem fazer fogo de artifício!

«coisas que fascinam (162)» - bagaço amarelo

A memória mais forte que tenho dela é o toque dos seus dedos. Foi com ela que aprendi que a compatibilidade entre duas pessoas pode ser o toque, muito mais do que a voz, a semântica ou o cheiro. Ou melhor, os toques todos. Aqueles que acontecem quando se dá a mão na fila do supermercado e se discute o preço dos chocolates, mas também os outros, que nascem e morrem no segredo duma cama.
Por causa desses toques, caminhámos em silêncio durante uma parte importante da nossa vida, unidos pelos dedos. Uma vez parámos num pequeno café em Espanha, a caminho de lugar nenhum. Lembro-me das ruas desertas, do calor intenso e do estranho sabor agridoce na boca, logo pela manhã. Era ali que eu tinha prometido levá-la, para a devolver a casa depois daquele tempo que decidimos ser o nosso. Deu-me um abraço, estendeu-me a palma da mão esquerda no ar e colou a dela à minha. Ao afastá-la, brincámos com as pontas dos nossos dedos, como se todos os toques estivessem ali guardados.
Acho que ainda estão. Eu, pelo menos, ainda os sinto.


bagaço amarelo
Blog «Não compreendo as mulheres»

Luís Gaspar lê «Os noivos» de autor desconhecido

O noivo escreveu um poema para a noiva pouco antes do casamento:

Que feliz sou, meu amor!
Domingo estaremos casados,
O café da manhã na cama,
Um bom sumo e pães torrados

Com ovos bem mexidinhos
Antes de ir p’ ró trabalho
Tudo pronto bem cedinho
P’ra inda ires ao mercado

Depois regressas a casa
Rapidinho arrumas tudo
E corres pro teu trabalho
Para começares o teu turno

Tu sabes bem que, de noite
Gosto de jantar bem cedo
De te ver toda bonita
Com sorriso ledo e quedo

Pela noite mini-séries
Cineminhas dos baratos
E nada, nada de shoppings
Nem de restaurantes caros

E vais cozinhar p’ra mim
Comidinhas bem caseiras
Pois não sou dessas pessoas
Que só comem baboseiras…

Já pensaste minha querida
Que dias gloriosos?
Não te esqueças, meu amor
Qu’em breve seremos esposos!

Como resposta, a noiva escreveu um poema para o noivo:

Que sincero meu amor!
Que linguagem bem usada!
Esperas tanto de mim
Que me sinto intimidada

Não sei de ovos mexidos
Como tua mãe adorada,
Meu pão torrado se queima
De cozinha não sei nada!

Gosto muito de dormir
Até tarde, relaxada
Ir ao shopping fazer compras
de Visa, tarjeta dourada

Sair com minhas amigas,
Comprar roupa da melhor
Sapatos só exclusivos
E as lingeries p’ró amor

Pensa bem… ainda há tempo
A igreja não está paga
Eu devolvo o meu vestido
E tu o fato de gala

E domingo bem cedinho
Em vez de andar aos “AIS”,
Ponho aviso no jornal
Com letras bem garrafais:

Homem jovem e bonito
Procura escrava bem lerda
Porque a ex-futura esposa
Decidiu mandá-lo à merda!

Ouçam este poema na voz d'ouro de Luís Gaspar, no Estúdio Raposa

Sempre juntos

Sempre, mesmo.



Pô gente, a saudade melhora o relacionamento.

Capinaremos.com

17 novembro 2013

«Rumo ao futuro» - por Rui Felício


No meu gabinete de trabalho, há uma cadeira destinada a quem me vem consultar.
É confortável, pode ser manobrada para baixo, para cima, para os lados, é reclinável e está rodeada de variados instrumentos eléctricos. Parece uma cadeira de dentista, mas não é.
Ontem, uma cliente entrou, sentou-se e, depois de nos cumprimentarmos, perguntei-lhe ao que vinha.
Desencaixou a máscara, uma espécie de capacete semelhante a um grande ovo de cor creme e depositou-a em cima da minha secretária.
Pediu-me que lhe avivasse as sobrancelhas, lhe rosasse as faces, lhe repuxasse as pálpebras e lhe arrebitasse um pouco o nariz.
Agora, despojado da sua máscara craniana, o cérebro da minha cliente ficara à vista, esponjoso, ondulado, composto por aleatórios refegos sobrepostos.
Enquanto eu retocava a máscara craniana como me pedira, ia olhando constrangido, de vez em quando, para o seu cérebro nu ali ao alcance das minhas mãos, provocador...
Reparei nalguns neurónios soltos, desligados e perguntei à cliente se não queria que os soldasse.
Respondeu-me que sim e, já agora, que podia aproveitar para limpar o pó que devia estar a bloquear-lhe alguns dos circuitos cerebrais.
Deixei cair dois microscópicos pingos de solda nos neurónios afectados e testei a passagem dos impulsos eléctricos.
Liguei a pequena escova adjacente à cadeira e, delicadamente, fui limpando as poeiras entranhadas nos mais pequenos interstícios, aconselhando a cliente a não tirar a máscara muitas vezes, porque assim desprotegia o cérebro, sujeitando-o à sujidade ambiente
Devo-me ter descuidado ao fazer a limpeza do hipotálamo porque a minha cliente, de súbito, foi inundada de calores, abraçou-se a mim e incitou-me a fazer amor com ela.
Acordei hoje de manhã, confuso, com este sonho ainda bem presente.
Retive que tudo se passou na minha outra vida futura, no ano de 3152.
A minha profissão era (será) a de técnico neurológico.

Rui Felício
Blog Encontro de Gerações
Blog Escrito e Lido

Postalinho da Praia do Camilo, em Lagos

Os gatos



Ai Senhor Doutor, venho fula! Imagine que recebi uma carta do marketing da Sheba. Sim porque eu tenho um gato, o Trafaria.

E não é que aquelas almas para vender os novos Sheba de Natal com ganso e galinha me escarrapacham uma fotografia de uma rapariga junto da árvore de Natal e do seu gato, sentada no chão da sala, num lençol de cetim, com uma lareira por trás e vestindo uma coisa de seda que tanto pode ser um vestido como uma camisa de dormir?!...

É claro que se notam as formas da rapariga que está ali embasbacada a olhar o céu como se esperasse que de lá caísse um anjo, obviamente bem artilhado de sexo, para a aquecer por dentro com a sua velinha e a fazer saborear as delícias da quadra num bacalhau com todos.

Oh Senhor Doutor e porque é que eu fiquei fula?!... Ora porque aqueles gajos do marketing, e só podem ter sido gajos, pensam que as mulheres que vivem só com gatos estão sempre à espera que lhes caia um gajo em casa, de prenda. E eu, na minha humilde opinião, julgo que uma mulher que gosta de gatos se quiser um homem, ronrona-lhe ao ouvido, dá-lhe uma lambidela no pescoço enquanto lhe passa a mão pelo material e depois, é só abrir o fecho éclair e puxá-lo para casa.

Papas pouco, papas...


Objetos (espaço dedicado aos nossos amigos diários)