Carne mimosa, carne cor de rosa
Nada mais sois, oh anjos, na poesia
Dos vates dissolutos de hoje em dia,
Nos romances de amor, hedionda prosa.
A vossa alma gentil, ideal, mimosa,
Nestas idades de descrença ímpia,
Como escondida, numa estátua fria
Sonha e não voa, de voar medrosa!
Anjos chorai o Amor! Com voz dolente
Dizei-lhe adeus! Bronco recife
Se apruma entre ele e vós, cruel, ingente:
Que par mais que de vinhos o borrife,
Ninguém gosta de ver, continuadamente,
Diante de si, fatal, o mesmo bife!
in “Novas Rimas” a Cândido de Figueiredo.
João Penha
(1838-1919)
Ouçam este texto na voz d'ouro de Luís Gaspar, no Estúdio Raposa