«Garrafa com casal em madeira no interior» da colecção de arte erótica «a funda São» |
Há muitos anos que não ia a Torres Novas.
Sentei-me ao balcão, pedi um whisky com gelo e, enquanto esperava, observei-me no espelho em frente. Será que aquele era eu? Pareceu-me que o espelho me dizia ter uma vaga ideia da minha pessoa, agora com alguns cabelos brancos e umas quantas rugas no rosto.
O empregado colocou o copo em cima de uma base quadrada de madeira e serviu-me.
Já não era do meu tempo.
Poucos minutos depois, sentou-se ao fundo do balcão, aquela senhora elegante, bem vestida, ainda bonita e atraente, ligeiramente maquilhada, com ar vago, meio triste.
Tantas e tantas vezes nos tínhamos encontrado naquele bar há uns trinta anos atrás, sem nunca termos trocado mais do que fugazes olhares e sorrisos disfarçados. Ela bebia sempre a mesma coisa. Um Gin Tónico...
Quantas vezes tinha pensado dirigir-lhe a palavra, mas sempre ia adiando para o dia seguinte, receando que a minha iniciativa pudesse ser mal interpretada.
Tomou a sua bebida, fez sinal ao empregado, pagou e levantou-se.
Sorriu, fez-me um imperceptível aceno com os dedos e encaminhou-se para a porta de saída.
- Esta senhora vem cá todas as sextas-feiras, bebe um Campari com laranja e vai-se embora, disse-me o empregado mesmo sem eu lhe perguntar nada.
Campari com laranja era a bebida que eu sempre pedia, neste bar, há trinta anos atrás, murmurei eu...
Rui Felício
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