05 novembro 2017

«coisas que fascinam (205)» - bagaço amarelo

Fui esperá-la ao cais. Embora fosse totalmente diferente, o barco que acabara de encostar à terra fez-me lembrar um conto de Mark Twain e aquela embarcação a vapor que atravessa o Mississipi nos seus contos do Tom Sawyer. Talvez seja o meu lado lírico, pensei. Na verdade, o que eu estava a ver era apenas um cacilheiro. O Sol batia-lhe por trás e, por isso, reconheci-a apenas pela silhueta. Fiz-lhe um gesto com a mão como que a dizer "estou aqui" e uma série de passageiros olhou na minha direcção. Talvez ali, naquele lugar e momento, houvesse mais umas dezenas de almas com um primeiro encontro marcado, à procura de alguém que fizesse um gesto igual ao meu.
Ao abraçá-la percebi isso mesmo. Pelo canto do olho vi uma série de abraços tão iguais e tão diferentes quanto o nosso. Por isso fechei os olhos por dois segundos, para que o meu pudesse ser só para mim. Quando a larguei, já só estávamos os três no mundo: eu, ela e a cidade.
E é sobre isso que eu quero escrever. Sobre a cidade.
Quando a deixei de novo no cais, ao fim da tarde, já o Sol se encontrava no outro extremo do horizonte. Provavelmente andara louco, lá em cima, à nossa procura nas ruas esguias da urbe. Fiquei a ver o barco desaparecer no rio de prata durante algum tempo e, quando finalmente me voltei, a cidade não era a mesma.
É que quando um lugar testemunha um abraço, passa a fazer parte desse momento para sempre. Se lá voltarmos, um dia mais tarde, esse lugar segreda-nos a recordação que temos dele. É como se esse abraço fosse um carimbo no tempo e no espaço em simultâneo.
Mais tarde, podemos pedir ao tempo se esqueça dele, mas nunca o podemos pedir a um lugar. No que diz respeito ao Amor, o espaço combate o tempo.


bagaço amarelo
Blog «Não compreendo as mulheres»

Brincar...


Cada vez somos mais condicionados a portar-nos como minhocas, sem coluna, sem sentimentos, sem poder de discordância, em nome de uma paz social. Paz social podre, porque só beneficia quem comanda o tabuleiro e nos quer fazer peões.


Velhos tempos...



Eu cá sou da Geração à Racha.

Patife
@FF_Patife no Twitter

04 novembro 2017

«dias escritos com o sal-flor das mãos inteiras» - Susana Duarte

morre-se azul sob os escolhos de sal
das (des)contruções
de areia. é no lugar das sementes,
e dos sóis verdes dos cabelos, que se morre azul.

com o sal das neblinas dos olhos,
morre-se sombrio
ante as ondas submarinas do ventre,
e escolhe-se a vereda estranha
dos dias salinos das lágrimas.
é no lugar delas que se morre, palavras
escorridas por entre as águas do peito.

são escuras, as palavras.
são claras, as palavras.

morre-se dentro delas, mar imprevisto
de ondas alteradas.
morre-se. navega-se no sal dos cabelos,
onde o futuro é o olhar percorrido
pelos dias
de antes.

morre-se. as ausências desmesuradas
do sal
dos beijos,
são a morte silabada
dos dias.
os dias silabados serão sempre teus,
pequenos e intermitentes,
como a morte dos dedos.

mas serão dela,
da mulher,
os dias escritos com o sal-flor
das mãos inteiras.

Susana Duarte
Blog Terra de Encanto
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Reencontra-a-Funda - uma estatueta em cada mesa

No jantar e Sãorau do Reencontra-a-Funda, cada mesa tinha uma estatueta da colecção de arte erótica «a funda São».










Piça of cake


03 novembro 2017

«Lavou, Tá Novo - Episódio 12: “Lavou, Tá Novo”» - Humores Urbanos

Se você é uma dessas pessoas que leem as descrições dos vídeos, precisamos dizer algumas coisas: Sim, todos os nomes dos episódios terminam com reticências propositalmente. Sim, Oswaldo caiu do berço quando era criança e Leonardo tem cara de trouxa, mas é porque ele é. Gisele não é tão megera quanto parece (ninguém é vilão ou vilã de nascença, é no que esse canal acredita) e Maria Clara não é tão pura como podemos supor ao longo dos episódios.

Resta apenas uma pergunta: Quem é o gato zumbi...

Te vemos numa próxima temporada!

Fondazione Frida Castelli



http://www.fridacastelli.com/

«Amor e sexo» - Mário Lima


Se alguém te oferecesse flores dirias: «É Impulse», mas não, debruçado sobre a mesa com ramos de flores, alguém dizia: «Quer frôr?».

Ele olhou em redor, não sabia qual a razão daquela pergunta pois encontrava-se só. No entanto a personagem não despegava da sua mesa continuando a sua ladainha: «Quer frôr?».

Olhou fixamente o homem à sua frente sem o ver. Os contornos de um corpo, surge-lhe na mente. Um corpo de mulher.

As suas mãos acariciam-lhe o corpo, perdendo-se em cada curva do seu rosto, do seu peito, das suas axilas, do seu vértice.

Demoradamente, retem cada pedaço daquele momento. A luz suave das lamparinas reflecte-lhe um corpo maduro mas viçoso. A cada toque seu, um murmúrio de prazer, um suave tremor, um querer sexual, mas sem pressas como cada toque fosse o último, como o exalar de desejo fosse único, como se nunca tivesse amado assim.

As suas pernas, semi-flectidas, tapando a essência do sexo, tornavam misteriosos os caminhos que em cada momento se iam descobrindo como se o desbravar tivesse os seus custos, a sua persistência em tons de azul, como se o céu estivesse ali tão próximo e tão longe.

Suavemente, os corpos entregaram-se ao amor, amor em sexo, sexo em amor. Olhos fitavam olhos, corpos em perfeita sintonia, os lábios tocavam-se, não em sofreguidão mas com leveza.

- Quer frôr?

A esta pergunta ele volta de novo àquela mesa onde se encontra. O torpor do momento, da lembrança extingue-se lentamente à pergunta que lhe é feita:

- Quer frôr?

Ele pega numa flor como se, naquele instante, voltasse a colocar uma flor na mão daquela mulher que, deitada, ficou na cama com os olhos semicerrados enquanto ele descia as escadas ao encontro da noite.

Mário Lima
Blog O sonhador

#máquinazero - Ruim

Eu gosto de ir a cabeleireiros rapar a pouca lã capilar que tenho. "Pffff, saíste-me cá um nilas, ó Ruim." Certo. Ter uma gaja a lavar-me a pinha e outra a mimar-me o pêlo é de roto. Ir ao barbeiro cheio de gajos musculados de barba a passarem a navalha molhada junto às beiças é que é à homem. Mas voltando à minha ex-namorada no congelador #vacafria, um gajo quando entra num cabeleireiro cheio da gajedo com rolos na cabeça a lerem a Hola! de 2006, é prontamente olhado de cima a baixo como se fosse uma criança a entrar numa casa de strip por engano, tipo "o que é que este está aqui a fazer?". Quando pergunto se cortam o cabelo a homens, parece que estou a pedir um bife da alcatra numa sapataria dado o olhar de admiração que me lançam. Mandam-me sentar, cochicham e chamam-me logo de imediato para me lavarem a cabeça. Ora, é por isto que eu venho aqui, sabiam? Há qualquer coisa de maternal em ter uma gaja a lavar-nos a cabeça. Ali fico eu. Regalado. "A temperatura está boa assim?" - perguntam. "Sim, mãe... quero dizer, sim está óptimo!". Adoro sentir aquelas unhas de gel cheias de bom gosto a massajarem-me as ideias. Encaminham-me para a cadeirinha, vestem-me o bibe apertadinho no pescoço e - mais que certo - perguntam-me como é que quero cortar o cabelo. Aquele que não tenho. "Olhe, faça-me uma mise! Perca a cabeça!". Não, f#da-se. Máquina zero. Elas até têm de olhar para a máquina a ver se o zero existe. Aproveito sempre para dar uma espreitadela à vizinhança e um ouvidinho à cuscovilhice do bairro, mas o cabredo muda logo o discurso quando sentem o odor a macho. Rata velha é rata velha #sabemmuito. No final, sacam daquele espelho retrovisor de cabeças e pincelam-me com pó de talco no cachaço. Na hora de pagar é novamente uma confusão, porque nunca sabem bem o que devem cobrar por terem efectivamente cortado o cabelo a alguém que vai sair dali diferente de como entrou.
O único problema dos cabeleireiros são as gajas. As que lá vão. Devia haver um cabeleireiro que não pudessem entrar gajas!

Ruim
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