Havia qualquer coisa nela que ultrapassava o tolerável. A sua presença melíflua toldava-lhe a razão, embotava-lhe o bom-senso e entulhava-lhe as sinapses. O seu avistamento causava-lhe imediatamente um meio arroto ácido, de mau paladar e pior aroma e quando ela se aproximava já ele tinha as palmas das mãos suadas, a boca seca e o hálito alterado.
Normalmente ela não dizia nada, mas sorria. Mostrava-lhe os dentes, imaculadamente brancos e milimetricamente alinhados, e o hipócrita sorria, mas nada dizia, nem conseguia. Olhava-a nos olhos, cor de avelã, como se a quisesse afastar. Cilindrar. Desintegrar. Fixava-a apenas para lhe transmitir o seu desprendimento, o seu desdém, a sua sobranceria, mas via-lhe as longas pestanas, as cuidadas sobrancelhas e o brilho sedoso dos olhos. Ela mantinha o sorriso, natural, contagiante, atraente, ele retribuía com um esgar em forma de sorriso, as têmporas a pulsar e ligeiras, mas desagradáveis, convulsões que tentavam expulsar de forma violenta e espectacular o seu conteúdo gástrico.
Até que um dia ela lhe falou e tudo mudou.
– Pagas-me um Calippo? – Perguntou ela, insinuante.
– Pago – respondeu ele, cheio de si.
Ela aproximou-se e sussurrou-lhe ao ouvido:
– Eu gosto de abocanhar.
– Gostas? – Espantou-se. Olhou-a nos olhos cor de avelã. Ela acenou com a cabeça, semicerrou as pálpebras e humedeceu os lábios com a ponta da língua. Ele avançou: – E beijo ao natural, fazes?
– Fellatio?
– Broche – esclareceu.
– Não! – Decretou ela, com enfado. – Não gosto de rajás quentes.
– Não?! – Rosnou ele, armado em mau. – Então, se queres gelados, paga-os tu!
de garfiar, só me apetece
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