19 fevereiro 2008

O broche chinês de João César Monteiro


Cena do filme «Vai e Vem», de João César Monteiro, concluído pouco antes de sua morte, em Fevereiro de 2003.
João Vuvu esclarece uma amiga de longa data, em detalhe, sobre a prática do brochim - broche chinês - e, de seguida, contextualiza politicamente esta "tecnologia de ponta":
- Com o teu melhor punho garroteias o tronco peniano para que o fluxo sanguíneo se comprima em torno da coroa da glande. Quando esta se apresentar rúbida e tumefacta, seguras a pele do prepúcio com a ponta do polegar e do indicador e sopras-lhe para dentro... prrrrrrrr... conservando-a sempre muito esticada e hermeticamente colada aos lábios... tchhh... tchhh... tchhh... tchhh... do mesmo golpe, cuspinhando... pttt... pttt... depressa e bem, até que fique cheia como um odre. Tapas muito bem tapadinha e deixas o todo murchar em branda evanescência.
— E o parlamentar?
— Lavrará o seu protesto. É uma questão de tempo. Já lhe falece o ímpeto falocrático, não evita a sofreguidão e acabará por bufar: "Então, amor, não chupas?".
— E não chupo?
— Não. Era o que faltava. Explicas-lhe, com bons modos, que na China ninguém chupa, que essa prática é mais própria de sanguessugas que de seres finamente civilizados. Neste passo, o tribuno vacila, entaramela-se-lhe a voz, quer gritar pela mãe, mas não pode: tem a minhoca à mercê, escancarada à rés pública. A democracia está salva, ou, pelo menos, o que dela resta, na sua grotesca expressão teatral. Que após acesa discussão, dura batalha no hemiciclo, legisla: "o broche chinês, também designado por brochim, devido à sua remota origem asiática, é especialmente recomendado para senhoras ou meninas que não se sentem cativadas pela arte de bem o fazer, ressalvando que os incentivos, que no âmbito comunitário, lhe serão facultados, devem inserir-se numa rigorosa política de desenvolvimento das indústrias de recreio e lazer, pelo que o seu exercício será obrigatoriamente orientado por profissionais altamente qualificadas e com sobejas provas dadas em tão laboriosa e intricada tecnologia de ponta." A velha puta pode, enfim, sorrir.
...
— Quando é que nos voltamos a ver?
— Quando formos suficientemente velhos. Por ora, hesitamos como toda a gente. Aqui entre nós, e não deixa de ser engraçado, o brochim é o broche dos broches, a súmula. Mas esta gentalha nunca o saberá. Para a corja nem uma sede de água.

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