03 agosto 2013

«coisas sobre mulheres que leio nas portas de casas de banho públicas (6)» - bagaço amarelo

Não gosto das novas casas de banho dos restaurantes e dos shoppings. Já não são como antigamente, em que a porta e as paredes estavam repletas de escritos e sabedoria popular. Agora estão sempre limpas, o que é o mesmo que dizer vazias de conteúdo. É muito raro encontrar uma casa de banho à antiga, embora uma vez por outra ainda seja possível, num restaurante duma estrada nacional ou num tasco esquecido dos subúrbios da cidade.
Também é verdade que a internet acabou em grande parte com esta forma de comunicação. Agora escrevemos qualquer coisa num blogue ou numa rede social e ela é lida por milhares de pessoas. Dantes, as portas das casas de banho públicas eram a melhor garantia de chegar a um grande número de pessoas. Nos anos setenta e oitenta, as casas de banho eram a rede social mais popular do mundo.
O problema estava na questão de género. Como as casas de banho eram divididas por géneros, também o eram todos os posts escritos a caneta, esferográfica, ou até com um isqueiro queimando a madeira das portas. Aquilo que um homem escrevia, era lido apenas por homens. O mesmo se passava com as mulheres.
Pensei nisto hoje por causa da Eva, que me ligou logo de manhã para combinar um café. Lembro-me dela me ter explicado uma vez, há muitos anos, que para Amar alguém temos primeiro que gostar de nós mesmos.
Discordei e, a meio de algumas cervejas e argumentos, interrompi a coisa para ir à casa de banho. Mesmo à minha frente, por cima do autoclismo, alguém tinha pintado com um grosso marcador preto: "Odeio-me a mim mesmo, mas estou apaixonado por ela!".
A discussão chegou a um ponto em que, com este meu último argumento e a pedido da Eva, fiquei à porta da casa de banho dos homens durante dois minutos, para ela poder entrar e ler a frase com os seus próprios olhos. Insistiu que tinha sido eu a escrever a frase. Desmenti.
Coincidência ou não, deu-me hoje razão nessa matéria. Uns vinte e cinco anos depois.


bagaço amarelo
Blog «Não compreendo as mulheres»