As duas últimas duas semanas e meia passei-as na minha quinta, em Caria, em habituais, necessários e laboriosos trabalhos de poda, que ficou a meio por já não conseguir levá-la até ao fim duma só vez. Daqui a dias lá tenho que retomar o serviço interrompido.
Para quem desconheça ou receie a atividade da poda atrevo-me a recomendar, fruto da minha experiência, que façam como eu: avancem sem receio, pois é daquelas coisas que se só se aprendem e só se aperfeiçoam, praticando. A experiência é, neste caso, muito mais importante do que a teoria.
Para se ficar a saber um mínimo de poda, ou para melhorar o desempenho, não é indispensável a frequência de cursos de formação ou andar de livro na mão, qual Kama-Sutra, a ensaiar ou praticar as diversas posições e técnicas, desde a tradicional, à francesa, passando pela inglesa ou pela californiana. Nada disso! A poda aprende-se no próprio ato, praticando. É um pouco como conduzir um carro: não se pode estar sempre a pensar nos instrumentos e na forma de os manejar; deve-se ser espontâneo e encontrar aquele automatismo desprendido, deixar-se lavar mais pela intuição do que pela racionalidade, até descobrir o ritmo mais adequado. Como referido acima, isto só se consegue com o treino. E não vale desesperar ou desistir.
Claro que nestas coisas da poda, o saber é importante mas a ferramenta também conta muito, não ficando atrás. No caso da ferramenta, o que posso dizer é que o tamanho não importa: a qualidade é que é decisiva, sobretudo se quiser que dure e evitar grandes esforços.
Em termos de técnica, esta deve ser adaptada às circunstâncias. Por exemplo, é muito diferente dar uma poda em árvores nuas (de folha caduca) ou vestidas (de folha perene).
Estando nuas, a poda torna-se mais fácil pois está tudo ali à vista, é só assestar a ferramenta.
Já no caso das vestidas, o assunto muda de figura e torna-se complicado, pois toda aquele emaranhado dificulta a visão e a própria ação, sendo necessário, previamente, meter os dedos para arredar os empecilhos.
A poda é igualmente diferente consoante se trate de árvores jovens ou velhas.
Quando são novas e, por isso, viçosas, apresentam-se bonitas, vigorosas, pujantes, tenras e macias. A ferramenta penetra nelas facilmente, até rechinam ao seu contacto. Neste caso, a poda não é cansativa e acaba por ser um prazer. Aqui deve haver uma preocupação com a sua formação. E convém deixá-las bem abertas. Inclusive, o serviço pode, com vantagem, ser feito de pé.
Tratando-se das velhas, a poda terá que ser sobretudo de manutenção. Não surpreende que se torça o nariz quando tem que se fazer o serviço, pois são mais duras, secas, angulosas, e de casca grossa Para se fazer alguma coisa de jeito tem que se estar para ali a serrar. Gemem ao passar a ferramenta. E é um trabalho cansativo, tem que se andar sempre no sobe e desce.
Num caso e noutro é preciso atenção aos filhos, que devem ser evitados por serem muito sugadores de energia.
É curioso - e isso mais parece uma ilusão de ótica - que, antes da poda, e mesmo durante, os paus, vistos de baixo, parecem enormes. Porém, acabada a poda, e já por terra, o seu tamanho, estranhamente, torna-se muito minguado, parecendo ter diminuído para menos de metade. E, no entanto, o pau é o mesmo, só varia o ângulo de visão!
É à medida que o trabalho avança que se fica a saber melhor o que deve ser feito a seguir, e como. Quando se chega ao fim fica-nos um sentimento de satisfação que logo se esvai ao constatar que se tem que começar a seguinte. Mas o melhor é sempre nem pensar em quantas ainda faltam, para não desanimar.
Não me considero um especialista da poda. Talvez porque comecei já tarde. No entanto, acho que estou em condições de ajudar quem do assunto perceba menos do que eu. Por isso, fico à disposição de quem precisar e o solicitar, seja com a ferramenta seja com o know-how.
António Pimpão
PS – Ao reler o texto, suspeito que o mesmo possa ser suscetível de uma segunda leitura. A ser isso verdade, confesso que não foi esse o meu propósito, pois só tinha uma em mente (que não é de mentir). E a que pensei foi exatamente essa em que também está a pensar. Claro que quando se escreve não se está livre de espíritos malévolos darem uma interpretação diferente. Daí, lavo as minhas mãos.