O teu rosto inclinado pelo vento;
a feroz brancura dos teus dentes;
as mãos, de certo modo, irresponsáveis,
e contudo sombrias, e contudo transparentes;
o triunfo cruel das tuas pernas,
colunas em repouso se anoitece;
o peito raso, claro, feito de água;
a boca sossegada onde apetece
navegar ou cantar, ou simplesmente ser
a cor de um fruto, o peso de uma flor;
as palavras mordendo a solidão,
atravessadas de alegria e de terror,
são a grande razão, a única razão.
Eugénio de Andrade
Ouçam este texto na voz d'ouro de Luís Gaspar, no Estúdio Raposa