22 janeiro 2017

«coisas que fascinam (199)» - bagaço amarelo

Aos dezanove anos escrevi a minha primeira história de Amor. Escrevi-a com o intuito de fazer um filme e, com excepção de algumas pessoas que me são muito próximas, nunca a mostrei a ninguém. Uma dessas pessoas é uma mulher por quem estive muito apaixonado e que acabou por ser a mãe da minha única filha. Separámo-nos dezasseis anos depois e hoje em dia, com quarenta e quatro anos, já perdi a conta às vezes que reescrevi a história. Ainda não fiz o filme.
Na verdade, cada mulher que fez parte da minha vida faz também parte da última versão da história. É por isso que a reescrevo. Se um dia, por acaso, eu conseguir mesmo passá-la para o ecrã, sei que nele poderei ver um pouco de todas as mulheres por quem me apaixonei. Saber isso traz-me de alguma forma uma sensação de alegria e também de angústia, porque naquelas páginas estão, ainda que de forma imperceptível para a maior parte dos potenciais leitores, tantos princípios como finais de Amores que sempre imaginei eternos.
Há algum tempo que não lhe pegava. Na verdade, tinha-a guardado numa pen de sessenta e quatro megabytes que comprei há sete anos e que estava cheia de pó numa gaveta onde guardo todo o tipo de recordações que não tenho coragem de ver de forma regular. Até hoje, dia em que a estive a ler porque, mais uma vez, preciso de lhe fazer alterações.
Das poucas coisas que aprendi com as diversas histórias de Amor que vivi, a mais importante é que a seguir a uma acaba sempre por vir outra. É assim que mantenho as forças para, em tempos estéreis, conseguir escrever sobre Amor.
Para além disso, e ao ler sobre os abraços que cada uma dessas mulheres me deu, percebi também que nenhuma mulher abraça da mesma forma. Sei, pelo menos, que o que um homem sente quando é abraçado por uma mulher nunca é igual ao que sente quando é abraçado por outra. Talvez seja assim que um homem se apaixona ou não. Através da singularidade de um abraço.
Se algum dia fizer o filme, quero que o último abraço, na última cena, pareça tão longo e tão curto como todos os abraços que recebi até hoje.


bagaço amarelo
Blog «Não compreendo as mulheres»