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12 outubro 2011

O Jogo da Cabra Cega

Chega.
É para isso que a noite nos oferece
o manto negro, para nos vestir de sonhos
quando despimos os pesadelos, estranhos
sapatos que calçamos horas a fio, tece
estrelas em redor dos nossos pés. Esse
teu vazio, eu também o chorei, e venho
aqui dizer-te isso mesmo, não contenho
mais todas estas palavras, mais não, se
tu choras, eu choro. Chega. Esconde-se
de nós o deserto, não vês? Eu apanho
do ar a tua solidão e rasgo-a, suponho
que lhe possa dar nós e mais nós, trouxe
comigo as minhas mãos, sim, enrola-se
e nunca mais se há-de desenrolar. Chega!
Vendei-me de ti para o jogo da cabra cega,
nunca, nunca mais vejo mais nada. Chega!

06 outubro 2011

Vem, meu amor...

Vem, meu amor,
e descalça-te
à entrada da porta, toda esta noite,
assim, imensa, vermelha, gigante
já não nos surpreende a saudade.
Vem, meu amor,
e despe-te
contra mim, toda esta noite,
assim, a solidão chega rente
à cama e não se estende: é cobarde,
nesta terra de pele onde me arde
a tua imagem, não se entranha, bate
mas volta para trás. Vem, meu amor,
e esconde-te
entre mim e o meu corpo, toda esta noite,
assim, é apenas um inimigo muito forte
mas só cai dos céus porque se rende
mas só vem à terra porque se rende.
Vem, meu amor,
e deixa-te
cair, assim, que o meu corpo já pende
sobre o teu e o escuro sobre a noite.
Vem, meu amor...

04 outubro 2011

Aqui está o segundo video de apresentação da minha colecção

Muito obrigada mais uma vez, Miss Joana Well, Luís Gaspar, Joana Moura e Bill Evans!
E já está na forja mais um video com um poema do Jorge Castro (OrCa)... e depois ainda outro, com um texto também dele. Todos pela voz de ouro do Luís Gaspar.

«Carícias ao nosso olhar» - a funda São from São Rosas on Vimeo.


O primeiro video ainda pode ser visto aqui.

02 outubro 2011

Direcção: nós!

Chegou uma multidão, assustou o silêncio.
O silêncio assusta-se assim,
é como um pássaro que pousa ao pé de nós,
não nos podemos mexer, ou olhar muito,
respirar com força, falar ou acenar.
Foi-se embora
e ficaram os ecos estranhos da multidão,
são bárbaros que tentam violar
a terra funda dos meus pensamentos.
Eu não me fui embora,
não fugi, aterrorizada da multidão,
da massa uniforme que espanta
os mais lindos e doces pássaros.
Eu não fugi porque tu estás aqui
(eu sei que pareço não olhar)
tu és a única redoma que me segue pelo mundo
e a vontade que eu tenho, por vezes, de sair dela.

29 setembro 2011

Tradução do amor (II)

Não sei quando
nem sei como
tudo isto começou
Tudo isto começou
e nenhuma luz acendeu
e nenhum sinal inequívoco
nenhum cumprimento à porta
do inferno em chamas do meu peito
antes de temperar o meu coração
Amo-te
e o tempo não fez o favor
de me anunciar
a minha nova vida
Amas-me
tu a anunciarás.

28 setembro 2011

Assim ou Sopas

Gosto de fazer amor devagar. Não estou a falar de sexo Tântrico, à la Sting (que afinal acabou por confessar que exagerou para nos impressionar) mas simplesmente de sexo lento, feito com atenção a pormenores: a forma como os meus mamilos endurecem e escurecem quando são estimulados, como o meu sexo incha, humedece e amolece em preparação para receber a carne hirta que dele se aproxima, a alteração do ritmo na minha respiração e do bater do meu coração. Gosto de reparar nesses pormenores da alteração dos cheiros no ar quando dois corpos se oferecem para trocar prazeres, de estar atenta ao momento em que as vozes se tornam ligeiramente mais roucas e mais ofegantes, gosto de tomar atenção a tudo isso enquanto prolongo o momento antes de ser penetrada. Poder estar atenta a esses pormenores requer tempo. Infelizmente para mim, isto não é exactamente compatível com esta minha condição quase permanente de ser “a Outra”.
Quando somos “a Outra”, são raras as vezes em que nos é concedido tempo para fazer amor como eu verdadeiramente gosto. Isto, independentemente do número de orgasmos. Para mim, atingir o orgasmo só é um objectivo quando me masturbo. Quando preciso de um orgasmo. E consigo perfeitamente chegar lá sem fazer amor. Quando se tem pressa, não se faz amor. Fode-se. A “rapidinha” é uma foda. Uma bela foda, mas uma foda à mesma.
Uma das relações que tive enquanto “a Outra”, foi com um homem incapaz de usar preservativo. Assim que eu abria a prata do preservativo, ele começava a desfalecer. Tentámos de tudo! Preservativos com sabores, sem látex, inseridos com a minha boca, vedei-lhe os olhos para tentar disfarçar o momento de lhe enfiar o barrete e… nada! Ele ia-se sempre abaixo!
Ora sabendo eu que nos vários anos do seu casamento entediante ele molhava frequentemente o seu pincel em vários boiões de tinta, não me atrevia a deixar que ele me viesse molhar o pincel no meu boião sem certos cuidados…
Andámos nisto durante meses a fio – a fazer amor sem penetração. Chegámos a um ponto em que já nem nos preocupávamos com tentar o preservativo. Amávamo-nos lentamente, ríamo-nos, tínhamos conversas intermináveis entrelaçados em posições que nos pareciam impossíveis, beijávamo-nos longamente de forma ofegante e trocávamos carícias. Nunca me ocorreu sequer trazer um vibrador para as nossas brincadeiras, tal era a forma como nos satisfazíamos mutuamente.
Na última vez que estivemos juntos algo inesperado aconteceu: entre risos jocosos, resolvemos tentar outra vez “enfiar-lhe o barrete”. Com uma mão a acariciar-lhe os testículos e a outra a ajudar a minha boca e língua a desenrolar o preservativo, ele manteve-se mais atento que nunca até eu o montar devagar, os dois a tremer na ânsia de sensações novas. Baixei-me nele até que ele estivesse completamente dentro de mim, ele sentado no meio da minha cama, as luzes acesas, eu sentada em cima dele, os meus seios ora se roçavam contra o peito musculado dele, ora eram recebidos pela boca dele, os nossos olhos bem abertos, humedecidos pelas sensações, incrédulos ao que se estava a passar.
Depois ele estragou tudo… trocou-nos as posições para que ficasse ele em cima e começou a foder-me àquele ritmo que me faz lembrar os cães quando se montam uns nos outros ou quando montam a perna de uma pessoa. Fodeu-me com movimentos curtos e bruscos durante muito tempo, trocando de posição mas não voltou a deixar-me estar em controlo. De repente, no meu quarto, havia apenas o pénis dele e uma vagina, que nem sei se ainda era a minha. Depois de se vir, deitámo-nos lado a lado sem dizer uma palavra. Ele com um sorriso na cara e eu… só sei que sentia a pele fria e uma certa apreensão. Ficámos assim no silêncio algum tempo até que ele se mexe, a tactear algo na mesa de cabeceira. A embalagem dos preservativos. Quando vi que ele já estava outra vez erecto e que estava a abrir um novo preservativo, levantei-me da cama, vesti o meu roupão de seda e disse-lhe nas calmas “vai-te embora. Não me voltes a contactar.”

27 setembro 2011

Com todo o orgulho, aqui está o primeiro video de apresentação da minha colecção

Estou toda molhadinha...
Muito obrigada, Miss Joana Well, Luís Gaspar, Joana Moura e Bill Evans!
E já está na forja mais um video com outro poema da Miss Joana Well. De seguida, haverá mais dois videos, com um texto e um poema do Jorge Castro (OrCa).


«Caminhantes no vale da sedução» - a funda São from São Rosas on Vimeo.

25 setembro 2011

Tradução do meu olhar

Está intacto, o vocabulário do meu peito.
Nenhuma palavra me abandonou,
nem a palavra que eu matei,
nem a palavra que estrangulei,
nem a palavra que deixei, órfã, no refúgio do coração.
Se, por vezes, o meu olhar te parece estranho
é porque o olhar são as mãos dos olhos
e, atrás deles, escondem-se essas palavras,
então, eu estarei a tocar o nosso mundo
com esses dedos, dedos que fervem
porque o silêncio ferveu tudo o que eu não disse
até à ebulição, e transbordou-me para o teu colo.

22 setembro 2011

Laura Poema

Nos braços de Laura, à volta da cintura
o verso de um homem pode encontrar
a mais bela melodia: abraçada ao verso,
por magia, da boca sem rosto do seu dorso,
há-de nascer-lhe uma canção. Não espera,
Laura não espera, porque havia de esperar?
Não, Laura diz agora; sem nenhum esforço,
diz agora e mergulha no homem até ao pescoço:
ele chegará a terra quando a ouvir cantar.

21 setembro 2011

Ciclos

Sempre tive jeito para os homens. Das outras.
Não me perguntem porquê. Seja como for, esta faceta da minha personalidade é algo que escandaliza as minhas amigas casadas e causa admiração nas solteiras. Sinto-me bem neste papel – não falo do empréstimo da casa, do arranjo do automóvel, do custo da escolinha do Afonso. Em vez disso, falo de experimentar o novo restaurante Japonês ou de sítios a visitar durante a minha próxima viagem de trabalho.

Mas nem tudo são rosas nesta minha vida. Os jantares em locais remotos ou, quando à vista de toda a gente, sob pretensão de jantar de negócios ou amigos, sem aquele roçar indiscreto de perna na coxa; acabando depois com um adeus prematuro para ele não se enfiar despropositadamente tarde entre os lençóis da Legítima. Às vezes canso-me destas peripécias e tenho vontade de ter algo diferente – mas apenas temporariamente.

Há pouco tempo aconteceu-me uma incrível – conheci alguém, quase por acaso, e a conversa animou-se imediatamente. Em dois dedos, parecia que nos conhecíamos há dois anos. Ele convidou-me para jantar e eu aceitei antes sequer que ele tivesse acabado de formular o convite. Durante o jantar, a conversa fluiu como o vinho, enquanto a comida permanecia quase intocada. Depois disso uma saída, um pé de dança, mais conversa, mais bebidas, uns beijos trocados. Quando o táxi me deixou à porta de casa, “Convidas-me para subir?”, “hoje não, bebi demasiado e já não estou própria para consumo, fica para a próxima”.

A próxima foi poucos dias depois. Convidei-o eu para jantar na minha casa. Jantamos na varanda do meu 3º andar, virada para o mar e o luar numa noite quente. Mais uma vez, o vinho e a conversa fluíram enquanto a comida ficou nos pratos. Falamos de tudo e mais alguma coisa, quando ele diz “por falar em adultério (…)” sem pensar duas vezes, levantei-me e empurrei-o da varanda, atirando também a cadeira onde ele estava sentado, as duas garrafas de vinho vazias, o frapê e os pratos ainda com a comida, enquanto gritava com toda a minha força “não voltes a fazer uma coisa destas!”

Não, não foi assim. Mas por meio segundo foi o que me apeteceu fazer. No entanto, contive-me e disse-lhe “óptimo. Assim não me dás dores de cabeça."

18 setembro 2011

A prostituta azul (XVIII) - O meu homem

Pensei que nem só esta rua me conhecia.
E que procurei eu nos teus braços?
Uma árvore, um caminho, uma estrada?
Pensei que nem só esta rua me conhecia
troquei-me por um mapa dos teus passos
e uma esquina tua vendeu-me: sou nada!

15 setembro 2011

Tradução de amor_ódio

É a fusão que sempre mata
pela consequente cisão:
primeiro, eles amam-me,
depois odeiam-me de paixão
Não, por favor, não me amem
que logo, logo, me querem matar:
ah, fui mil vezes sujeita
às vinganças do vosso adorar!
Não me ergam uma estátua,
se eu sei que não vou ficar:
quando, um dia, quiser ir ,
estátua e eu vais querer partir,
quando, um dia, quiser partir,
não é só estátua que vais quebrar!
Não, por favor, não me ames,
vamos apenas ser decadentes,
amantes cegos e dedicados
à força das volúpias ardentes,
eu juro-te, são ainda mais quentes
condenadas à efemeridade,
sim, que nesse triste antecipar
uma desesperada saudade,
a paixão come da perda,
engorda-nos, coniventes,
e, um dia, já separados,
quebra-nos, juntos, o doce penar.

11 setembro 2011

Tradução de um despertar Universal

A menos que sejas sonâmbulo
primeiro despertas
só depois te ergues do leito.
A paixão é como um sono
mas, embora não sejas sonâmbulo,
só Deus sabe onde estarás quando abrires os olhos
e se nesse sítio existirá amor.

08 setembro 2011

A prostituta azul (XVII) - Perdoa-me

Tu chamas-te Azul e és azul. É por isso que aqui venho, para encontrar essa coerência. Todas as pessoas deviam ter nomes iguais às suas cores: quando as pessoas têm nomes iguais às suas cores, tudo é tanto verdade que os seus corpos são translúcidos. Não, não é que eu queira ver o teu interior, tudo é terrível nas entranhas humanas, tudo é terrivelmente nítido, talvez ainda mais nítido nas pessoas opacas. Gosto de olhar os teus olhos e ver, através deles, os contornos da porta. Gosto de olhar o teu peito e ver, através dele, o contorno das janelas. Gosto de ver, através de ti, atrás de ti, tudo o que são saídas, que são saídas de ti, e que posso fugir de ti. Sei que nunca me verei através de ti, porque não posso estar atrás de ti e à tua frente, a olhar-te e a ver-me, no mesmo instante; sei que nunca serás um espelho, sei que posso fugir de ti. Eu chamo-me António e parece-me que sou cinzento. Mas as pessoas chamam-me vários nomes diferentes todos os dias: Doutor, Engenheiro, pai, primo, Professor, colega, irmão, amarelo, vermelho, dourado, lilás... Se me chamassem, pura e simplesmente, cinzento, tudo isto se evitava, a verdade é translúcida, tudo o resto são apenas espelhos: a luz não trespassa, reflecte. Assim, gostam mais ou menos de mim conforme gostam mais ou menos de si próprios. Já ninguém é apenas o que é - somos todos apenas espelhos desde que nos resolveram chamar todas essas coisas que não são a nossa cor. Quase fico ali, imóvel, vencido perante tanto azul, mas o tom muito rosado dos teus mamilos, em contraste, a tua única cor diferente, a nódoa do teu desejo, sugere-me duas ilhas, e lanço-me sobre a jangada do teu corpo que balança, balança, só azul a toda a volta, até nos devolver a terra firme. Gostava de ter papelinhos azuis para te deixar mas só tenho papelinhos coloridos de feio, perdoa-me.

04 setembro 2011

Bebe-me

Bebe-me
que eu sirvo-te estremeções
que eu sirvo-te a dor
que eu sirvo-te rasgões
por uma gota de amor

31 agosto 2011

Sentença

Lamento
mas faz tempo que já sei
tu nunca hás-de beijar o meu ombro
tu nunca hás-de afagar o meu cabelo
Porque, esse dia em que o fizesses, ao chegar
significaria que este meu amor que tenho
aqui, agora
este que me beija o ombro
este que me afaga o cabelo
já aqui não estaria
e, se esse dia chegasse,
eu não quereria existir
e, se por alguma tragédia medonha, macabra,
se por algum castigo impiedoso dos Deuses
eu continuasse a existir
ainda assim
não permitiria que mais ninguém
afagasse o meu cabelo
beijasse o meu ombro
não permitiria
que algum dia espantassem
o que sobra dele, do meu amor,
ainda que tudo o que sobre
de um amor eterno
seja a mais triste solidão.
Por isso, nunca mais me digas
que, um dia, ainda hás-de beijar o meu ombro
nunca mais me digas
que, um dia, ainda hás-de afagar o meu cabelo
porque eu ouço as tuas palavras doces
como a mais terrível, a mais cruel sentença,
o mais horrível destino
que alguém me poderia desejar.

28 agosto 2011

Tradução da Lua (II)

Eu gosto da lua
que se esconde atrás dos prédios.
Eu gosto da lua
que se esconde atrás das árvores.

Eu gosto da lua
que é uma mulher da rua
na esquina espera e enrola
os caracóis nos dedos.

Eu tenho uma lua
que se esconde atrás do peito.
De vez em quando ouço-a cantar.
Quando canta um dó chama-se angústia.

26 agosto 2011

Neste querer...

Neste querer, tanto a alma quer
que nos desalma e vai
que nos desalma e sai
de nós e vai aprender a viver
sai e vai beijar onde nos doer
foge-nos das pernas nuas e doridas
foge-nos das mãos frias e cansadas
foge, se a pele nos quer endurecer.
Neste querer, da alma faz-se mulher
e alma menina que, assim, também sou
fugida do corpo meu que não me abraçou
tenho abraços que não obrigam a crescer
basta ser, deixam-me ser
e as nossas almas, pela doçura tocadas,
consertam mãos e pernas quebradas
não deixam a nossa pele morrer.

24 agosto 2011

Inventei...

Inventei
o teu beijo no meu ombro,
sim, eu ainda procuro
memórias que não inventei
da tua mão no meu cabelo.
No teu colo sosseguei
e inventei,
e da minha casa fiz castelo,
sim, inventei uma verdade
para enganar esta saudade,
um corpo molhado de pesadelo
que no teu rosto acalmei.
Inventei-te
num sussurro de peito aberto,
num suspiro intenso, nu, descoberto,
e canoas nos meus olhos
inventaram mar nos teus dedos,
mas não veio a onda e chorei.
Inventei-te,
e tanto que te esperei,
meu amor, que já nem sei
se apenas te inventei.

21 agosto 2011

Tradução de Banho-Maria

Outra vez que não vieste,
e eu dizia-te adeus,
mas tu não te despedias
meu amor, um beijo, adeus,
mas tu não me ouvias

Se afinal nunca chegaste,
diz-me, meu amor, porque não partias?