Sinto-me a enlouquecer.
Olho em meu redor e tudo me parece estranho, trocado, desajustado.
Já não reconheço as pessoas. Nem a forma como se comportam. Nem aquilo que dizem.
Parece que estou num filme de Woody Allen, em que não se percebe a sequência, a lógica, o contexto nem o enredo.
Sinto-me a viver uma má trip,em que tudo e todos os que me rodeiam estão desfocados, descontextualizados. Os seus lábios mexem mas as palavras que ouço não são as que estão a ser ditas. Os seus corpos movem-se mas de forma contrária ao que seria natural.
Quem sou eu e o que faço aqui?... Ou melhor, o que sou eu; que papel represento neste palco insano?...
Pessoas entram e saem neste teatro de forma aparentemente aleatória. Mas todas me olham, me apontam, me criticam e me julgam... Quem são estas pessoas que, apesar de fisicamente não me serem estranhas, não as reconheço?... E o que querem de mim? O que devo fazer? O que esperam que faça?...
Vejo partir sem razão nem explicação aqueles que prometeram ficar.
Vejo chegar aqueles que sempre quis ter longe e nunca pretendi conhecer.
E, como que amarrada por correntes invisíveis, sinto-me impotente para contrariar esta cena mal concebida do teatro da minha vida.
Já nem a mim me reconheço... procuro-me e não me encontro... deveria ser a actriz principal desta peça mal escrita. Mas sou uma mera espectadora. Sem voz. Sem acção. Sem reacção.
Não me encontro e tento encontrar-me em ti. Mas tu também não estás. No teu lugar vejo uma sombra imóvel de contornos indefinidos, que apesar de ter o teu cheiro e usar a tua voz, em nada mais se parece contigo.
Tento gritar mas o som não se ouve. Quero fugir mas as pernas não me obedecem. E à minha volta dezenas de vultos conhecidos tentam parecer a realidade do espectro que representam. Sons imensos, infindáveis e imperceptíveis rebentam-me os ouvidos.Caminhos que esbarram em portas fechadas.
Estou a sonhar, penso. Um pesadelo demasiado realista mas que, se fechar os olhos com força e tapar os ouvidos, vou conseguir sair dele; vou voltar a acordar e tudo voltará a ser como era.
Mas não, não consigo sair daqui... Onde estou, meu deus?... E porquê?...
Estou louca, só pode ser isso. E é a minha loucura que me faz ter esta percepção distorcida da realidade.
Porque o que vejo, oiço e sinto agora não pode ser a realidade. É a antítese de tudo o que era real. Ou que eu julgava ser real.
Meu deus, meu deus, o que se passa comigo? Que mundo horroroso é este onde acordei agora? Como vim cá parar? Que mal fiz eu?
E onde estão os meus? Aqueles que diziam amar-me? Os que me procuraram quando precisaram, os que comeram à minha mesa, aqueles com quem partilhei os meus sonhos, medos e fantasias? Onde estão aqueles que prometeram estar sempre ao meu lado e nunca me abandonar? Onde estão aqueles que eu prometi amar? Quero acarinhá-los, quero fazer com que se sintam seguros e assegurar-me que nunca virão para este lugar perdido.
Vejo tantos e não reconheço nenhum.
Vejo tudo e não reconheço nada.
Não há outra explicação. Estou a enlouquecer...
Eva
blog Eva portuguesa - porque o prazer não é pecado