- Tem CR&F? - perguntei.
- Tenho, mas também tenho mais baratas.
- Quanto é a CR&F? - assustei-me.
- Três.
- Pode ser.
A mulher com mais de trezentos anos olhava para mim. Eu sabia-o, embora ela não estivesse dentro do meu ângulo de visão. Há olhares que pesam sobre nós, mesmo quando não os enfrentamos. O homem, por qualquer motivo que nunca vou perceber, serviu-me duas CR&F duma vez e cobrou-me só uma. Em silêncio, cheguei à conclusão que ele sabe que quem bebe CR&F nunca bebe só uma. É uma questão estatística e, pela parte que me toca, tem razão.
- O Ronaldo é muito melhor que o Eusébio. - disse o homem.
A mulher com mais de trezentos anos ri-se, embora eu tenha dúvidas que saiba porquê. Peço mais duas aguardentes com a condição de pagar só uma. Os bares dos subúrbios da cidade são embrulhos de solidão. É por isso que gosto deles. São os únicos capazes de pegar na solidão de várias pessoas e embrulhá-la duma forma bonita, como se fosse uma prenda de Natal.
Lembro-me de ter ido a este mesmo bar há uns oito anos atrás, pouco tempo depois do meu divórcio e quando me sentia o homem mais sozinho do mundo, com excepção de todos os outros, e de ter visto a mesma mulher com mais de trezentos anos e o mesmo homem a ler jornais desportivos.
Tal como as fases da Lua, há coisa que nunca mudam.
bagaço amarelo
Blog «Não compreendo as mulheres»