Por vezes acontece-me conhecer mulheres que gritam silenciosamente, e gritam algo que provavelmente nunca diriam. Como há dias, quando estive numa mesma sala com uma mulher, numa reunião sem destaque, que se apresentava no topo da compostura, de cabelo bem penteado e roupa muito cuidada, discreta, elegante. Desconheço-lhe a idade. De certo modo, é irrelevante. Talvez trinta e muitos, ou quarenta e poucos. Ficaria surpreendido se fosse menos, ou mais.
Falou-me com um cuidado imenso. Num português sempre cuidado. Os gestos pareciam calculados. De extrema boa-educação, não era deferência para comigo. Era, senti, a sua forma de estar. Levou muito tempo a sair da minha cabeça a sua imagem. Fiquei marcado por ela, assim como fico marcado por outras que, ocasionalmente, produzem o mesmo efeito. É que, notem bem, por detrás de toda esta compostura e irrepreensível tacto, havia algo nela, no seu olhar, que gritava de forma muda um “por favor, fodam-me”, e eu dei por mim a pensar que nada a faria mais feliz, naquele momento, senão ver os botões da sua roupa voar pelo ar, arrancados de sopetão, empurrada contra a parede mais próxima com corpos em colisão, em esmagamento até, num rubor fantástico, do proíbido e de sensações que, tristemente, aquela sua expressão facial me dizia não conhecer há muito.
Fiquei embalado nessa ideia. De a ver com as calças escuras pendendo sobre uma cadeira, os sapatos longe, a blusa rasgada e o cabelo despenteado, mas sorrindo, sorrindo rendida de corpo suavemente pousado depois de uma maratona de arrepios e ondulações. Feliz. Às vezes acontece-me notar isso nos olhos das mulheres. Suspiro, porque sou apenas um, e elas tantas.