15 agosto 2012

«pensamentos catatónicos (272)» - bagaço amarelo

O Amor corre sempre bem ou mal. Nunca corre mais ou menos. Quando corre mais ou menos é porque está a definhar, se é que ainda não está morto. Essa é a sua maior desvantagem, ao mesmo tempo que também é a maior vantagem. Estar mais ou menos é a única forma de nunca se sofrer, mas é também um atalho para que se morra sem ter dado pela vida.
Pensei nisto agora mesmo, depois de ter visto a Ana como é costume, de braços cruzados num dos cantos da sala. Parece que está à espera que a vida lhe traga alguma coisa. Mas eu até sei que não está. Quando a cumprimentei e lhe perguntei como anda, ela respondeu isso mesmo: que vai andando. Não estiquei mais a conversa. Deixei de o fazer há uns tempos, quando ela me disse que detesta conversas de circunstância e me deixou especado a olhar para uma parede branca, a pensar no mal lhe teria feito. Acho que lhe disse que estava bonita. Só isso. Ela não ligou e afastou-se.
Por essa altura a Ana deixou-se derrotar por um Amor acabado, que é como quem diz, ela acabou com esse Amor. Parecia um náufrago em alto mar que não queria ser salvo. Ainda parece. A história é a do costume: o marido deixou-a e ela ficou mal. Depois, para não andar mal, decidiu que ia estar mais ou menos para sempre.
De vez em quando encontro-a por aí, como hoje, numa festa organizada por amigos comuns. Estou à espera de lhe poder dizer, numa oportunidade qualquer, que é uma sorte podermos sofrer por Amor. Sofrer por Amor é a única forma de saber o que é Amar. É a única forma de agarrar a vida e deixarmos de andar mais ou menos. Para isso só preciso que ela passe a gostar de conversas de circunstância, porque o Amor é uma circunstância da vida.


bagaço amarelo
Blog «Não compreendo as mulheres»