16 fevereiro 2010

Ficheiro secreto

Ouviu soar a campainha às primeiras horas da manhã e interrompeu de imediato o que estava a fazer. Abriu a porta e deparou-se com o rosto do seu amante secreto, expressão determinada.
Afastou-se para lhe dar entrada e mal teve tempo para balbuciar um bom dia enquanto ele fechava a porta com um pé e a agarrava com os seus braços fortes com a firmeza que lhe conhecia e a arrastava aos poucos para o quarto onde ela bem sabia o que a esperava, já meio despida e ele todo espalhado por cima de si.
Ambos sabiam que o tempo urgia e nenhum tempo se perdia a conversar, era o prazer a comandar mais o instinto que os mantinha rotinados naquela visita ocasional mas frequente o bastante para que já nem precisassem de combinar, ele só precisava de aparecer com aquela vontade tremenda tão bem reflectida no seu olhar.
Como uma boneca de trapos via-se colocada na posição que ele decidia enquanto a comia, sôfrego pelos dias de ausência que se impunham para evitarem repetir algum tipo de convenção naquilo que nem assumiam como uma relação mas apenas como um imperativo carnal, uma terapia sexual para algumas das suas lacunas por preencher.
E ele preenchia tudo aquilo que havia, dominador, e devassava-lhe o interior com a força do seu desejo, o gosto do proibido que afinal era consentido mas só podia acontecer assim, de surpresa, num momento qualquer do dia onde se cruzassem ou nos raros dias em que soubessem o paradeiro um do outro, o que lhes denunciava à partida a sede daquela fonte de vida que os estimulava a um ponto tresloucado e os empurrava para aquele ritual mantido em segredo mas quantas vezes acrescentado em tesão pelo risco corrido sempre que ele aparecia sem avisar.
E ela entregava-se sem hesitar porque não conseguia dispensá-lo dos seus dias tão iguais, tão isentos de emoções poderosas como aquela que sentia quando ele a possuía assim, palavras poucas e só mesmo no fim de alguns minutos de uma atracção animal, inexplicável, que mantinha aquela loucura indispensável entre duas pessoas sem ligação emocional assumida, ligadas apenas por laços de um passado recente que deveria ter-se esgotado num presente que os impedia (mas apenas em teoria) de viver aquele pecado a dois.
Ele limitava-se a seguir o seu caminho depois de cumprido o desígnio que o motivava, sabia que pouco durava aquele momento que ela encaixava no seu corpo e no seu tempo e num espaço remoto da consciência que anestesiava e assim não atormentava com sentimentos de culpa que pudessem destruir o encanto daquele apelo que pretendia manter porque sentia que precisava daquela pica que lhe dava o sexo porque sim.
Não aceitava que um dia chegasse ao fim, aquela explosão aleatória de tesão tão necessária para o seu equilíbrio mental, que do ponto de vista emocional estava bem servida porque tinha, para além daquela relação clandestina, quem lhe fornecia o carinho e o amor mas lhe falhava com aquele furor que ansiava muitas vezes num fogo que a consumia e só aquele homem possante lhe conseguia apagar.
Por isso ela às vezes até queria e lutava para impor a si própria um dia para aquela situação insana acabar mas nunca não conseguia mais do que apenas adiar.

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Uma por dia tira a azia