21 março 2012

«guardanapos» - bagaço amarelo

Apercebeu-se que gostava dela durante as compras num supermercado, ao discutir a cor dos guardanapos de papel que iam utilizar no jantar. Ela queria uns brancos mais baratos, ele queria uns surpreendentemente pretos. Duas douradas enormes, uma garrafa de vinho e um ramo de salsa já estavam no cesto. Faltavam apenas os guardanapos, de que se tinha lembrado ao estacionar o carro lá fora.
Conheceu-a algumas semanas antes, numa festa de amigos comuns. Todos beberam muito nessa noite, menos eles os dois, que ficaram a noite inteira a conversar na varanda com os copos de vinho vazios. Foram os últimos a sair e, quando se despediram, não trocaram os números de telefone nem beijos, apesar da vontade que ambos tinham de o fazer. Nesse dia cruzaram-se ao fim da tarde numa avenida da cidade e ficaram a conversar sentados numa paragem de autocarro, até ele a convidar para jantar lá em casa. Ela aceitou à primeira.
Ele sabe que só consegue ter discussões sobre temas banais com mulheres que é capaz de Amar, nem que seja por uns momentos. É sempre assim que detecta uma possível paixão, discutindo coisas sem interesse mas com o maior dos empenhos, tal como aconteceu enquanto os peixes assavam no forno. Primeiro falaram sobre vinhos, depois sobre as cidades de que gostam mais, sempre com os lábios de ambos cada vez mais próximos. Por fim fizeram Amor.
Começaram na cozinha e acabaram na chaise long da sala, com a roupa espalhada pelo chão como testemunha dos acontecimentos. Os quatro sapatos e a camisola dela na cozinha, a camisa dele e a camisola interior dela no corredor, as calças dele e o sutiã dela à entrada da sala. Finalmente, já junto ao ninho do pecado, toda a roupa que faltava.
Ele lembra-se que ao vir-se lhe cheirou a queimado, mas achou normal dada a fricção dos acontecimentos. Há momentos em que o cérebro humano é incapaz de prolongar um pequeno pensamento que seja, e por isso pode fazer associações surreais. Só ao acordar, duas horas depois, é que percebeu tudo. Ela já não estava, mas num dos guardanapos tinha deixado o seu número de telefone e um aviso de que a dourada estava queimada. Ah! e que é por isso que os guardanapos brancos são uma escolha melhor. Dão para escrever avisos e deixar números de telefone.


bagaço amarelo
Blog «Não compreendo as mulheres»

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