28 fevereiro 2007

Ilusão perfumada


Quando ele quis saber qual o perfume que eu usava imaginei que estava a fazer a pergunta cirúrgica para me etiquetar num qualquer estatuto social e estive quase a pôr-lhe um xis na testa, mas sem provas resolvi dar-lhe o benefício da dúvida, tanto mais que as suas nádegas e os seus neurónios ainda não se tinham revelado maus argumentos.

A investigação aprofundada e repetida revelou-me que ele me reconhecia pelo cheiro, o que o fazia iniciar sempre o ritual da cópula com o nariz cravado no meu pescoço em fungadelas persistentes e como o odor imprescindível era o do meu perfume, bastava trocá-lo por outro para lhe diminuir drasticamente o rendimento.

E um dia em que a moleza não me deslocou da frente da televisão descobri que com Lacoste ficaria de tal modo encalorada que só usaria vestidos frescos e leves até uma chuva tropical se abater sobre mim e me colar a roupa à pele para deixar transparecer as formas num autêntico chamariz para quem olhasse. Se optasse pelo J'Adore, libertar-me-ia dos desejos femininos das jóias, do dinheiro ou dos carros topo de gama na ânsia frenética de usar apenas a pele que trago de origem, atitude que qualquer homem agradeceria com os olhos marejados de alegria como se lhe tivesse saído o Euromilhões. Com o Noa seria virginal e clássica como o nascimento de Vénus de Botticelli e adequada ao anseio masculino de ser o primeiro, enquanto que para ser uma diva acessível apenas por fugazes instantes que indeléveis ficariam na memória, nada melhor que o Channel 5.

Continuo é sem compreender como é que sendo a perfumaria um mundo imaginário masculino, seja uma raridade encontrar homens a atender no balcão de uma.

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