- O feto não é uma pessoa – sê-lo-á mais tarde, caso se desenvolva normalmente;
- Ninguém com lucidez pode ser a favor da provocação do aborto sem fundamento, menos ainda como mero método contraceptivo... mas a primeira pessoa a pensar assim é a mulher grávida. E a pergunta do referendo é inteligentemente clara: o que está em causa é a descriminalização (ou não) da mulher que interrompe a gravidez em determinadas condições («técnicas» e de prazo);
- Ninguém com lucidez pode ser a favor de acusar como criminosa uma mulher que conscientemente não aceita ter um filho e, por isso, interrompe a gravidez nas primeiras semanas de gestação;
- Insinuar uma «solução» de crime sem pena é uma afronta à dignidade da mulher que interrompe a sua gravidez, como se o carimbo de «criminosa» por si só não fosse relevante. Aliás, basta o julgamento para que a dignidade da mulher seja posta em causa, pela humilhação e pela devassa da sua vida privada a que fica sujeita, como bem alertou Júlio Machado Vaz;
- A definição de um prazo para legalidade da IVG (10 semanas) é necessária e, pelo que as publicações científicas explanam, parece razoável. Alegar que 10 semanas e um dia já será ilegal é um argumento falacioso («definição de fronteira»). Aliás, o professor Marcelo Rebelo de Sousa também sabe que com 9,5 se passa mas com 9,4 se reprova. É injusto? Talvez, mas não será por isso que um aluno passa com qualquer nota! Ou que alguém poderá insinuar que a masturbação masculina é crime (só a igreja católica tem essa ideia peregrina, mas chama-lhe pecado) porque mata milhões de espermatozóides (que, com os óvulos, são também formas de vida);
- O homem que provocou a gravidez pode e deve ter uma palavra a dizer mas, havendo posições opostas, a decisão deverá caber à mulher grávida;
- A igreja católica tem tido algumas posições - ameaças de excomunhão a quem votar «Sim», IVG como pecado mortal gravíssimo, comparação da IVG ao terrorismo ou ao enforcamento do Saddam Hussein,... - que só por si justificam a rejeição de quem tenta ser racional nesta discussão. Recomendo que leiam a primeira encíclica de Bento XVI «Deus Caritas est» (Deus é amor), em que valoriza o amor erótico. Ou a teologia da sexualidade de João Paulo II, que defendia já antes de ser papa que "o homem e a mulher são pessoas iguais em dignidade"(1). Entretanto, não se livram de comentários como este, recebido por e-mail: "Nunca um coxo treinou atletas para a maratona nem um mudo deu aulas de dicção. Só os padres não prescindem de dar conselhos sobre a reprodução e a sexualidade";
- Os políticos deveriam decidir isto na Assembleia da República. Na praça pública, a argumentação é demasiadas vezes irracional e falaciosa, muitas vezes partindo de quem não tem qualquer autoridade para se pronunciar sobre este tema e gerando uma reacção de enfado por parte de muitas pessoas (levando à abstenção);
- O aborto clandestino, com todas as suas consequências - incluindo risco de vida para a mulher - não deixará de existir em caso de vitória do «não».
(1) citado por Yves Semen in «A sexualidade segundo João Paulo II», pág. 40, Princípia Editora, Estoril, 2006
Entretanto, deixo aqui algumas sugestões de leitura... e olhura sobre este tema:
Didas - "Uma História Moderna III", entre outros posts;
Rui Costa Pinto na «Visão» - "Uma questão de consciência";
Gato Fedorento - "Marcelo Rebelo de Sousa e o aborto";
Maria Árvore - "Desvario";
Gotinha - "adivinha";
OrCa - "Janeiras, janeiras... e o referendo";
Controversa maresia - "E que tal contribuir com os meus impostos para...";
Encandescente - "Sou mulher. Digo SIM no referendo sobre o aborto";
Gabriel em TopaTudo;
A Anani recomenda (e muito bem) Rita Ferro Rodrigues no blog sorriso-do-bisturi - "Carminho & Sandra";
Raim no Raim's blog (I)
Raim no Raim's blog (II)
"Já que a questão é dinheiro, que tal analisá-la em todas as vertentes?" - Didas
É certamente uma causa pela qual vale a pena... votar!
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