14 outubro 2009

«Marcas ou Memórias do Vento» - Maria Paula Raposo


Graças ao Dom OrCa, dinamizador de amizades (pleonasmo, pois "dinamizar" já incorpora "amizar"), conheci a Paula Raposo... e isso tem sido muito bom.
Agora, recebi de fresquinho o seu livro de poesias «Marcas ou Memórias do Vento», da série de livrinhos de cordel da Apenas Livros. Com uma dedicatória que é (para quem me conhece) um desafio: "Para a São Rosas, uns singelos poemas (não sei escrever eróticos!) esperando que, mesmo assim, gostes de me ler. Beijos, Paula Raposo, 09/10/12".
Ah, não sabes escrever poesia erótica?! Tens a certeza?!
Então o que são, por exemplo, estes poemas?

Saberei

Saberei da tua voz
Serena
Ao longo do caminho
Desbravado
Do encanto
E saberei
Das tuas mãos
Desenhando
O perfil perfeito
Da melancolia
No colo
De todos os meus sonhos.


Numa Maré

Vibro a paixão eloquente
Inesquecível e irrepetível
Não falada não dita.
Vibro profundamente
A tempestade
Numa maré
Em espuma desfeita,
Uma vaga de magia.
Vibram os sentidos
Em todas as palavras
Que se dizem.

E o que são os "súbitos compassos da noite", do «Compasso»?
E os bailados sensuais em afectos e paixões d'«A valsa das partículas»?
E quando encontras as cores dele dentro de ti, na «Pintura»?
E a recordação dos "beijos enlouquecidos" do «Princípio»?
E, no «Quadro», "o quadro macio dos teus dedos é a alvorada dos meus sonhos"?
E "permaneci na ousadia do teu corpo nu", em «Sonhos de Água»?
E o que tu gostavas, em «Ilimitado»?
E?...
Pois, Paula, alguns dos teus poemas são bem mais eróticos do que muitos que se autoclassificam assim.
A melancolia também pode ser erótica.
E, já agora, qual será a tua cor preferida? Com o "sorriso emoldurado de letras azuis" de «Como tu», o «Quadro» "azul", o "dia azul entre flores e mar" do «Uivo», nem precisavas dizer, em «O meu mundo», que "este meu mundo é azul".
Convenci-te, Paula?
____________________________
Pelo menos despertou a verve erótica da malta:
Gomalaca:
Contribuição para a poesia:

"Gostava de um dia ver-te nua
tal como Eva no Paraíso
e poder contemplar as pernas que diviso
sob a garrida veste tua.

Gostava de beijar teus lábios de coral
gostava de sugar teus seios provocantes
e quedar-me nervoso, por instantes
ante monstro de Vénus virginal

Depois, no mais macio e fofo leito
à luz mortiça de uma vela
mostrar-te o que é estar-me de pau feito

E numa fúria louca e repentina
untar-te o olho do cu com vaselina
e dar-te uma soberba enrabadela!

Nelo:
"Olheim melhéres questa laca
que çe antessede de goma
éi melhér com tanta grassa
queu do cu le fasso cona

Ai comele é vazelina
é fofuras, coizas táis
Gomalaca melherzinha
Né pressizo pr'curar maish

ele éi lábius de cural
Coiza queu tenho eim barda
já us çeios, aí tá mal
mash compenço com broshes há farta

Mash já shega de converça
tu Colinha de coiza Laca
anda já daí melhér
Que deshte Nelo nam te iscapas

OrCa:
"A Paula diz dessas coisas, mas nós é que sabemos... Olha, cá eu, quando leio dela um poema, muitas vezes returco - que, como se sabe, é ver um turco a dobrar...

ter em verso a alquimia de evocar
esse gosto a malvasia
de um olhar
um estar para aqui só por estar
muito perto do incerto do amor
e a boca
ter o gosto de uma flor
a crescer num jardim-melancolia
espalhado pelo corpo
que assim arde
em poente junto ao mar
ao fim da tarde
tal o Sol tange a água
que se acende
numa ardência que entre os dois
algum entende

e enfim muito lá no horizonte
cai a noite na carícia dos sentidos
mergulhar mar adentro
já perdidos
tal afago de madeixa em sua fronte"

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