Nunca sei muito bem como reagir quando uma mulher bonita se senta à minha frente num transporte público, como ainda hoje me aconteceu no metro do Porto. Finjo que nem reparei nela ou aproveito o momento para encher a vista? Sei lá. Não lhe adivinho o pensamento. Penso nesta expressão: "encher a vista" e lembro-me de estar na The National Gallery, em Londres, com a Raquel em frente a um Van Gogh. "Deixa-me olhar para este quadro mais um minuto, para encher a vista", dizia ela, e eu assentia acenando afirmativamente a cabeça. Os girassóis ali mesmo à minha frente e eu só olhava para ela, que era ela a minha paisagem.
Comecei por lhe ver os dedos dos pés, com as unhas pintadas de vermelho e umas sandálias coloridas que pareciam vindas daí, dum campo florido qualquer. Levantei a cabeça e os nossos olhares cruzaram-se por um instante, para se transformarem num voo errante e fugidio logo a seguir. Os olhos dela pousaram nas páginas silenciosas dum livro, os meus continuaram esvoaçantes como se fossem uma borboleta tonta. Às vezes no tecto, outras vezes na paisagem que corria lá fora, raramente nela.
Que linda!
bagaço amarelo
Blog «Não compreendo as mulheres»