24 junho 2005

Feirar


Galguei a Feira naquela tarde com a cabeça feita catavento para abarcar de uma assentada os livros que me podiam servir nas mãos. Era junto desses que parava a folhear-lhes a macieza do papel , a lamber com os olhos a volúpia das palavras, a inalar-lhes as imagens.

Dei de caras com uma biografia de Vitorino Nemésio, com encadernação de capa dupla e tudo e aquelas imagens a preto e branco como eu me lembrava da infância fixaram-me ali, encantada, a desfolhar frame a frame. Um dos rapazes do stand, o de olhos cor de mel, deixou-os escorrer para a voz para me perguntar se podia ajudar nalguma coisa e como responder-lhe faz de mim uma máquina-bilheteira do Metropolitano de Lisboa era equivalente a tornar-me croquete numa travessa de aperitivos, optei pelo tradicional levo este, com o indicador colado ao livro.

Feitos os avios, virei costas para continuar a peregrinação quando me passa pelos ouvidos a frase vai lá que ela não tinha aliança nem nada e como uma traça perante uma lâmpada catapulta-se à minha frente o moçoilo dos olhos melados a convidar-me para o acompanhar à roulotte dos churros e farturas, fitando-me muito fixamente não fossem as vistas fugir para locais menos apropriados como o meu decote que do topo das calças ele já tinha feito a métrica.

Aceitei o churro com molho de chocolate que nos fazia trejeitos nos lábios ao escorrer pelos cantos da boca enquanto ele discorria sobre o investimento dos CTT nos livros de prestígio com lombadas bonitas, trocávamos os nomes dos livros favoritos e eu imaginava se havia de começar a apreciar a qualidade daquela encadernação no coreto perto do Pavilhão Carlos Lopes ou manusear-lhe as fibras musculares na Estufa Fria ou simplesmente, rebolarmos como página ímpar e par relva abaixo.

Só que aquela alminha, imagina tu Sãozinha, a páginas tantas resolveu mostrar-se fã do Paulo Coelho e no mesmo instante a minha inspiração começou a amarrotar-se e só parou no cesto dos papéis.

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