28 setembro 2006

Díário dum Padre, parte II

Tinha acabado de olhar para ela de relance após ter entrado apressadamente pela pequena porta lateral que comunicava o altar directamente com a sacristia.
A noite tinha-me sido dolorosa, atravessada pelo flagelo da tentação, com o aflorar dos desejos que voluntariamente tinha jurado abdicar de satisfazer.
Toda uma doutrina me vinha ao cimo. Os ensinamentos e teorizações. Lembrava-me das conversas com o Mestre. Um padre versado nas leituras e interpretações das Sagradas Escrituras. Lembrava-me de algo que ele dizia: - Meu Filho. O que tem valor na opção que tomámos, é o facto que sermos homens e sujeitos às leis da natureza.
Somos homens! Já fui jovem como tu e sei o difícil que é o controlo sobre os nossos instintos.
Mas a obra de Deus é algo superior à simples condição terrena de sermos machos da espécie Homo Sapiens. O que Deus nos pede é que tenhamos o poder discricionário, que saibamos ter todos os dados nas mãos e exercer o livre arbítrio. Ter desejos de mulher e sentir a alegria insuperável de dizer não em função de algo imensamente valoroso que transcende a nossa condição básica..
Saber, em acto de fé, que a glória de servir a Deus é muito superior a todas as coisas. Terrenas e não terrenas.
Que valor teria a nossa opção se não implicasse um sacrifício? Vale de algo o celibato a quem não experimenta a atracção por vezes insuportável pelo sexo oposto?
Não! Quem não sente a tentação, não faz qualquer esforço na escolha. Nem se pode chamar sequer escolha pois a escolha implica optar por entre desejos de intensidade igual. Destacando uns e optando em detrimento e sacrificando outros, com toda a dor que isso implica. -
Acordei.
As palavras vagamente recordadas desvaneceram-se por entre os olhares da assistência
Enquanto ajeitava os objectos destinados ao culto em cima do altar sentia todo o corpo a crescer, como se fios invisíveis do meu interior se prolongassem em inúmeros e finos tentáculos na sua direcção. Levando pedaços de mim, dos meus átomos, das minhas células, dos meus fluidos sublimes Abraçando-a, beijando-lhe o corpo, entrando-lhe pelo sexo, penetrando-lhe a alma…
Meu Deus! Como era linda, e como de repente todo eu entrava em erupção, preso duma enorme erecção. Incontrolável e forte humedecendo-me as roupas interiores….

Regressei lentamente com os olhos postos no chão preso do sentimento de culpa por ter ido masturbar-me. Pedia perdão quase de lágrimas nos olhos ao Altíssimo. Pela fraqueza indesculpável que me tinha feito cair em tentação e pecar mesmo ali, a poucos metros do altar da casa de Deus, pesasse embora o bem que me tinha sabido o orgasmo intenso conseguido com o pensamento envolvido naqueles lábios e olhos que encimavam o templo escultural do seu corpo. Um orgasmo tirado de mim com a minha própria mão derramando, abundantemente no pequeno lavatório, o esperma há tanto tempo contido. E como me sentia agora mal pelo gozo inifinito que me tomara ao sentir o incontornável desejo de possui-la, de fodê-la enquanto me masturbava.
Celebrei a missa, sem olhar para ela nem uma única vez. Parecia-me que ela leria nos meus olhos o que eu teria ido fazer apressadamente antes da celebração. Em todos os olhares dos fieis que seguiam o meu olhar via ares acusadores. Sentenciados, condenando-me à eternidade das trevas, reino de Lucifer, o lugar do sofrimento atroz que eu antevia pelo sofrer que estava naquele momento experimentando.
Quando abri o tabernáculo para tirar as hóstias senti nojo de mim. Não era digno de tocar o corpo de Deus e distribui-lo aos fieis a quem se exigia que não estivessem em pecado.
Tomado de suores frios, pedi com toda a minha verdade interior perdão a Deus, uma e outra vez até a tosse oportuna do sacristão me fazer acordar para a realidade.
De mãos trémulas cumpri a missão e verifiquei aliviado como ela não comungara. Evitando o momento de tensão em que ela à minha frente abriria os olhos para os meus, abaixando-se enquanto entreabriria a boca pondo a língua a jeito para que eu lhe desse o pedacinho de hóstia consagrada, com toda a carga erótica que eu via agora nesse gesto tão comum em todo o mundo Cristão.
Acabei a missa num ápice e retirei-me para a sacristia.
Foi ai que a vi novamente. Dirigia-se me enquanto eu fazia por não vê-la e apressava o passo. A distância que medeia entre o altar e a porta lateral da sacristia não é maior que cinco metros, os mais longos de sempre.
Tocou-me no ombro fazendo-me parar num estremecimento e disse:
- Sr. Padre…!
Preciso de falar consigo…é muito importante… -

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