Levantava-se mais cedo que o mundo. Engolia o café a custo, pequenos goles que se arrastavam na garganta a descerem empastados pelo fluido da solidão que o mantinha engasgado. Apeteceu-lhe acordar a mulher. Abraçá-la e cheirar a sua combinação azul, macia, tão macia. Dormia, respirava pesadamente - certamente do ar que os rodeava, não devia ser apenas imaginação dele, aquele peso de uma densidade cinzenta e infeliz - ainda bela, ainda perfeita, agora perfeitamente distante e amorfa, alheada dele no seu vestido de frigidez completa. Cheirava ao amante, certamente um novo, o perfume e as feromonas masculinas eram diferentes. Acariciou-lhe o cabelo longo, beijou-lhe o pescoço de gazela. Ela balbuciou o nome do amante anterior. Amaldiçoou a boa sorte que lhe trouxe fortuna. Foram tão felizes no pequeno apartamento, lutavam os dois, lado a lado e abraçavam-se todos os dias. Suavam juntos. Conseguiu. As noites no escritório. As ausências. O cansaço. O afastamento. Sua culpa. Deu-lhe jóias, deu-lhe carros; ela perguntava se ele chegava cedo, se jantavam juntos. Afastou-se dele, lentamente. O homem derrotado pela vitória levantou-se da cama, onde se tinha sentado. Saiu devagar, fechou cuidadosamente a porta para não a acordar. A meio da ponte pediu ao motorista que parasse, que estava mal disposto. E voou...
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Uma por dia tira a azia