Amo-te! - Disse o amante, de corpo suado, nu, em cima dela. Aguardou, parado, expectante. Ela abriu a boca; não conseguiu falar, o som morreu engasgado no atrito dos pensamentos. Revoltado, gemeu a acusação impiedosa - amas um morto, é ele que tu amas! Respiraste-lhe as cinzas, os teus ossos absorveram-nas, entranharam-nas e faz tanto parte de ti que agora é o teu esqueleto. Ela lembrou-se. O grito lançado pela garganta, como se o corpo não lhe pertencesse, parecia planar sobre si mesma; debater-se, os empurrões em quem tentava fechar o caixão, o desespero...e fechou-se com ele para ser cinza. O ultimo soluço, a ultima lágrima secou e solidificou nas outras; formaram uma lâmina aguda, invisível, na garganta e no peito. Dispensou o amante. A todos os outros disse o mesmo: amava um morto. Há acusações que revoltam, que fazem espernear, são uma pele que não se nos cola, enjoa-nos o cheiro sebáceo e a sua cor quando os tentam misturar com o nosso; outras, em que acreditamos, transformam-nos naquilo que morava nos dedos apontados, essas têm o verdadeiro veneno.
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Uma por dia tira a azia