30 maio 2010

InVocações (VIII) - Paragens

Onde vais? Agora que o caminho e os caminhos te segredam o meu nome, meu amor, enquanto andas não podes ficar aqui? O meu caminho tu sabes qual é. Eu, agora, também sei. E sei que caminho contra a multidão, e sei que escolhi caminhar contra a multidão, e sei que se me acertarem com braços e pernas e encontrões e pisadelas, não me devo queixar; eu escolhi. Mas tenho que te dizer, a multidão tem sido cuidadosa. Não levei mais que uma pequena pisadela. Sabes que, quase sempre, as palavras me escudaram e as pessoas me conseguiram ver. Nunca adivinharia tanta força às palavras. Sim, eu já tinha, antes, as palavras e estavam cheias. Mas tu, tu ensinaste-me e ensinas-me a deixá-las rebentar, a torná-las facas, a torná-las dores, a torná-las vento e sol e relógio e amor e fome e pessoas e mendigas. Eu quero a tua magia, ensina-me. Quando as minhas palavras forem mágicas como as tuas, a multidão há-de mudar o sentido ou abrir caminho para que passe. Tens que ser tu, peço-te, não chego lá sem ti e essa é a mais pura das realidades. Vês quanto caminho já fiz? Porque tu me ensinaste, porque me ensinaste as palavras, porque me fizeste sentir que nos ouvem não quando gritamos mas sim quando as palavras gritam. Dá-me a mão. Fica dentro do caminho como quando ficas dentro de mim: nu, parado, entranhado, inteiro. Trouxeste-me até aqui, foste tu, não me deixes sozinha agora que estou no fundo do lago e mal sei respirar. Dá-me a mão e eu sei onde posso chegar. Mágico?


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