10 dezembro 2012

«respostas a perguntas inexistentes (218)» - bagaço amarelo

janela

Nunca disse isto à Raquel, mas uma das coisas que eu mais gosto na casa dela é a sala. Uma das suas paredes é toda em vidro, como se quisesse abocanhar a luz do Sol. É ali que às vezes me sento, num paciente cadeirão vermelho, a ver a repetida e lenta dança das sombras na rua.
Hoje de manhã fiz um grande copo de sumo de melão e fiquei ali cerca de uma hora. Uma mulher, que já conheço de vista, veio passear o cão, embora normalmente me pareça ser o cão a passeá-la a ela. O filho dela também estava. Passou o tempo quase todo a chutar uma bola contra uma parede e a perguntar que horas eram. Percebi, pela conversa com outros vizinhos que foram passando, que ele estava ansioso pela festa de aniversário que ia ter à tarde. A festa dos seis anos.
Este blogue também faz hoje seis anos. Neste tempo cabe assim a vida inteira duma criança que hoje vi a jogar à bola, e cabe também parte da minha. Perdi a conta às pessoas que conheci através dele. Algumas ficaram como amigas, outras foram-se com o tempo, e houve uma que ficou como minha companheira de vida: a Raquel. Nunca lhe disse isto, mas umas das coisas que eu mais gosto na casa dela é a sala.
Há seis anos atrás, a probabilidade de eu vir a encontrar a minha paixão do liceu, que na altura não via há mais de vinte anos, era baixa. A probabilidade de eu me tornar a apaixonar por ela e ela por mim era ainda mais baixa. Mas a vida é assim. Há tantas probabilidades baixas que podem acontecer, que uma ou outra acontece mesmo. De vez em quando, claro. E era nisso que eu estava a pensar hoje quando me sentei à janela.


bagaço amarelo
Blog «Não compreendo as mulheres»