31 março 2010

A razão dos enfermeiros



HenriCartoon

Prostituição: carta aberta (II) - Porta de saída

Sair daqui!
Tantas, tantas, tantas vezes me falam da iniciação. Perguntam-me como foi. Por curiosidade. Porque – nalguns casos – querem imaginar como vai ser.
Posso falar dos riscos, das dificuldades, dos cuidados. Não posso demover quem decidiu, claro, mas posso contar que este Reino tem inferno.
Não deixar que imaginem céus azuis por todo o lado. Não existem.
Falei da porta de entrada e do Reino; mesmo assim decidiram.
Agora deveria falar da porta de saída.
Mas não sei... Eu ainda aqui estou, não estou?
Há quanto tempo?
Demasiado para querer precisar. Muito mais do que previa. Porque as previsões, aqui, saem, quase sempre, furadas.
Olho à minha volta. Para quem conheço. O mesmo. Porta de saída?
Alguma coisa nos faz, quase sem excepção, ficar e ficar e ficar.
Existe porta, deixei de a ver; existe chave, perdia-a no peito.
Acho que mudei de dimensão e fiquei aqui, no tempo que me parece que parou mas que corre como nunca. E um dia acordo e fugiu-me o tempo.
E quem sou agora? A Joana que devia estar noutro sítio mas não conhece mais nenhum.
Onde foram os sonhos, os projectos e os objectivos? Foram mudando? Deixaram de existir?
E eu? Eu mudei assim tanto? E já fui e voltei.
Fui e voltei. Fui e voltei.
Esta porta, uma vez aberta, raramente se fecha; espera – talvez divertida – a reentrada. Sim, talvez divertida. Por isso, tantas vezes uma reentrada se sente muito mais como uma rendição do que uma primeira vez.
Regressei, desta vez, em Agosto. Não encontrei caminhos? Não encontrei quem sou? O que faço ainda aqui? Preciso de um plano. Mas com que direcção, com que objectivo?
Se fosse só eu... tantas, muitas, quase todas as que conheço.
Tu não? Espero que não. Mas eu disse o mesmo. E ouvi o mesmo – tantas vezes...
É uma teia; alguma parte de mim que não identifico como minha criou-a. Deitei-me nela e aqui fiquei.
Se me debater, esta teia não me enrola mais, solta-me.
Mas, não sei para onde ir e assim, se me soltar, só caio da teia abaixo.
E fico.
E volto.

Troca de postalinhos com o Bernardo Linhares

"Menina linda,
tenho uma porção de poemas eróticos dispersos. Vou procurar. (...)
Mande seu blog para
obernardo@hotmail.com. É do ramo no Brasil, vocês podem intercambiar, Lindíssima miúda.
Beijos nas rosas
Ildásio Tavares"

"Olá, Bernardo
Sou São Rosas. Sou portuguesa e tenho um blog erótico: a funda São.
O Ildásio Tavares foi-me apresentado pelo Casimiro de Brito. E agora o Ildásio me deu o seu e-mail, dizendo que «é do ramo» aí no Brasil.
Com o seu e-mail, encontro poesia no
Jornal de Poesia e, «no ramo», alguns poemas em Poetas del Mundo.
Estaria interessado em publicar estes seus poemas «do ramo» no blog a funda São?
A sua,
São Rosas"

"Olá! Seu nome é lindo!!! Mestre Ildásio exagerou.
Abaixo, seis poemas.
Bernardo Linhares


Rosa aberta III
Para João Ubaldo Ribeiro e Carol Castro
“Tornou-se a vida rútila e festiva”
Sosígenes Costa

A brisa sopra a pétala da rosa,
expele o pólen em forma de botão.
Vênus desperta da alma de uma concha.
O céu parece a cauda de um pavão.

O azul renasce namorando a aurora.
O mar não cansa, pensa que é criança.
O mundo gira, gira cor de rosa.
O sol e a lua trocam de aliança.

Trazendo o belo aos que amam o verso,
a luz do dia chora de alegria.
Tudo é sereno sobre as rosas brancas.

Com elegância e delicadeza,
tornou-se a vida rútila e festiva.
Uma lagarta vira borboleta.

Galo

Na alvorada de uma fantasia
a delicada espora é tua espada
com ela toca a rosa dourada
vate da Arcádia, oficial do dia.
Arauto arisco da madrugada
exaltando o prazer do teu hino
o sol derrama-se em porcelana
a fina aurora afina tua lira.
Flores e beijos estufam peitos,
luares e todos os olhares
inclinam-se em sinal de respeito.
O galo canta, canta o desejo;
será suave a noite de gala
entre as montanhas da minha amada.

O segundo beijo

Língua na língua,
língua nos dentes,
língua nos lábios,
beijo meu,
estou com ela na boca...
Boca que beija,
boca que morde,
boca que age.
Beijo meu,
estou com ela na boca
e mais ainda
quero que sinta a língua,
língua que lambe,
língua que trança,
língua que arde.
Beijo meu,
estou com água na boca,
estou com ela na boca
e nada, nada é igual,
a sentir nos seus lábios carnudos,
depois que desnudo,
na minha boca beijo meu,
o doce do seu sal.

Prece

Escutei o silêncio meu amor
da sua oração, celebrando a vida
num altar de espelhos.
Senti na sua boca
a ressurreição da carne
comungada num beijo.
Em devota posição, seu amor,
meu amor, me provaste de joelhos.

96 – 27

Deitada por cima,
quatro olhos fechados,
de ponta-cabeça em duas bocas,
seis lábios.
Quatro pernas abertas,
braços apertados,
unidos numa dezena,
ligados no mesmo cálculo.
Dois corpos, com três cabeças,
meia volta, volta e meia
flutuam no quarto.

Luau

Num mar tranqüilo de fim de tarde
o vento sopra a vela do dia,
a noite penetra pela fresta,
onírica, sim, ela suspira.
Adormecida sonha com anjos,
no silêncio do sem-fim desperta
nova e nua.Abraçando o oceano
no quarto crescente curva em arco
e toda inteira, recheada em chamas,
o vento lambe os seus fios dourados."

Sexualidade explicada com equipamentos da Apple

«Orgasmos Cotidianos» - Alfonso Lopez & Javier Roca

Outro livro que comprei para a minha colecção:


Aqui fica uma página, com a autorização de publicação pela editora el Jueves:

30 março 2010

O lado B de Ricky Martin



HenriCartoon

A ferro e fogo

A distância dos nossos corpos
assedia a ânsia…

Freme veemente em círculo ardente
e multiplica-se num desbravado caminho
de palavras que retrocedo
em alongado
gemido de carência.

Marco as minhas mínguas
a ferro
e todo o teu ser arde-me na pele
gravado em substância.

Aferras-te
e em mim
és perfeito na imensidão de homem.
Percorres-me em segredo,
lapidando as curvas
que à luz se entregam e
projectas-te em sol e fogo.

Não te enxergo a forma
mas sinto-te em fusão
correr-me no sangue.

À contrariedade do tempo que emerge,
gorgolo em devaneio
o teu nome decifrado.

Vera Carvalho - Pétalas Minhas
(foto de autor desconhecido)

Insatisfação


Foi paixão,
encanto, voz doce,
palavras de despertar:
encontro e magia.

Foi tentar despertar-te,
loucura e impotência,
querer-te e não ser capaz:
desejar-te.

Foi tudo, foi nada,
foi pouco e não muito,
um parágrafo,
um destilar de emoções:
voltar ao zero.

Foi e é: insatisfação.

Foto e poesia de Paula Raposo

Grupo Senior quer mostrar peça sobre Sexualidade na Terceira Idade noutros palcos. Convidam-nos?



Estreou no primeiro dia de Primavera. Seniores quebraram o tabu em «Respeitinho que sou tua Mãe...», "encenação de Luísa Monteiro - Grupo de Teatro Renascente".
Esteve um dia óptimo, o sol deu as boas vindas anunciando uma tarde diferente. Chegada aos bastidores, foi fantástico ver a animação, sem nervos à vista. As nossas séniores vestiram robes, toucas de "ir para a cama" e prometeram agitar a sala.
Chegada a hora, a sala ficou quase cheia! Obrigada a todos pela divulgação! As pessoas aceitaram o convite e vieram ver este grupo que tanto se empenhou nesta peça. O principal objectivo foi quebrar o tabu da sexualidade no envelhecimento. Com muita determinação, subiram ao palco, falaram de virgindade, de homossexualidade, de problemas sexuais, de solidão e de tantos outros temas, que se adivinharam, nas entrelinhas.
A meio da peça entrei eu. Levei um lubrificante, um óleo que aquece, umas algemas com peninhas, plumas e uns brinquedinhos vibrantes. Os brinquedos serviram de moldura para a conversa sobre prevenção das IST nos séniores, dos perigos da toma do Viagra sem orientação médica, da importância da lubrificação, entre outros...
A principal mensagem ficou lançada...Todos temos direito ao desejo e ao prazer... isto é apenas indicador que queremos ser felizes e que estamos vivos...
Excelente forma de começar a Primavera com este despertar de mentalidades...
Agora queremos correr o país, apenas estamos à espera de convites.
Precisamos apenas de uma sala e de público que nos queira conhecer.

Até breve, quem sabe se numa cidade perto de vós!
Convidem-nos... que nós vamos...
Divulgam o nosso projecto?

www.belizsexologia.blogspot.com


À moda da Cornualha


1 página

oglaf.com

29 março 2010

A prostituta azul (II)

Todos os dias escreve linhas. Escreve linhas para cozer peitos abertos. O homem viu os fios das palavras desfiadas a formar linhas que desejou que lhe fossem dedicadas. Olhou para o peito, já pouca coragem tinha de se encarar pelo coração. Deitou-lhe os dedos ao braço para fingir que tinha caninos nas falanges; olhava-lhe os seios, de olhos ofegantes, fingia que só os desejava e entraram na pensão. Mas quando se deitou na cama, só despiu a camisa.

Sempre que a amava

Sempre que a olhava percebia o privilégio. Sempre que a deixava cometia um sacrilégio e cumpria penitência, perturbado pela sua ausência, abrindo o peito aos requintes da maldade de um algoz chamado saudade que o consumia na câmara lenta, uma sensação que atormenta, um relógio imaginário com os ponteiros em sentido contrário, em rota de colisão com o caminho do coração acelerado pelo tempo quase parado, paradoxal, numa ansiedade fora do normal que o agitava por dentro e lhe baralhava as reacções.

Sempre que a pensava incutia mais tentações na vontade que já sentia de a tocar de verdade e de a arrepiar como se sabia capaz. Sempre que a deixava para trás, no seu ponto de partida, sentia a despedida como um castigo, a saudade sem abrigo exposta no olhar que a revelava, a imagem de um calendário com os dias em sentido contrário, no beijo demorado que anseia o tempo parado, contra-senso, e dessa forma acaba por anunciar, intenso, a chegada de um outro tempo que tanto custa a passar.

Pétalas do meu desejo


Toma os meus seios perfeitos
Que cabem inteiros nas tuas mãos
Passa tuas mãos no meu corpo cansado
Sente os meus seios gelados
Que são mais teus do que meus

Beija meu peito inquieto
Tal como a asa procura a flor
Empresta-me o doce trago da tua boca
Da tua língua humedecida
Onde se esconde o teu mel

Chamo-te com as mãos
E abro-te meu peito
Desce de onde estiveres, meu amor
Sorve de meus beijos, regatos tranquilos
Onde se abrem nenúfares brancos e perfumados

Fecha tuas asas de luz
Nas pétalas do meu desejo
Amado da minha Alma
Desejada visão que me acompanha
Como um sonho de amor

Tu, minha espiga de oiro
Que o sol beija pela manhã
Sente meus seios macios e rijos
Prova a doçura da minha boca
Fecha esta porta tão aberta como meu peito

No meu leito não há muros
Nem meus braços se cruzarão
Quando tocares meu corpo
Pois que tu és meu senhor
E eu a escrava que te espera

Guarda meus seios
Nas palmas das tuas mãos
Meu desejo é que me desejes
Agarrada à tua carne
Selo meu para que não me percas


Maria Escritos
© Todos os direitos reservados
http://escritosepoesia.blogspot.com

Papagaio anal


Alexandre Affonso - nadaver.com

28 março 2010

A prostituta azul

O homem tinha sido azul, nos tempos em que tinha sol que o aquecia. Agora, o azul empalideceu de cinzento. Agarrava todos os bocadinhos dessa cor que ainda lhe sobravam; nos cinzentos doía sempre uma dor vestida de prata aguçada, vestida da vida que sonhou um dia e que agora tinha e não sentia. Disse-lhe que lhe queria o corpo. Deu-lhe muitos daqueles papéis coloridos de feio que tinha na carteira. Deitou-a na cama e procurou os pedacinhos de azul que moravam no calor do sol dela.

Rimas


Daqui em diante
a tua palavra será muda
e surdos seremos,
porque nos teremos
em breve voz aguda.

Não voltes, não fales
(dirás coisas sem nexo)
cala-te, desaparece
deixa, esquece
e atira-te ao sexo.

Um dia não são dias
(já os avós diziam),
levemos de bem a vida
na linha enriquecida
dos romances que nos liam.

Nestas rimas tão simples
aflorou o sexo (por acaso),
era bom que assim fosse
um luar e um doce:
e adeus… acabou o prazo!

Foto e poesia de Paula Raposo

Vila Mimoza

Documentário de 2001 de Felipe Nepomuceno (6 minutos) sobre a Vila Mimoza, tradicional área de prostituição no Rio de Janeiro.
Outrora a Zona, o Mangue, o Baixo Meretrício. Cantada por poetas e sambistas de antanho, a mais tradicional área de prostituição do Rio de Janeiro agora ganha um documentário.
» Orquídeas do despudor - Património Erótico do Brasil




Link directo para o filme aqui.

Porno para toda a família, mas desta vez mais perfeitinho

A Didas cada vez faz melhor estas cenas de porno na padaria:



Pornos anteriores:
Primeiros
Segundos
Terceiros
Quartos
Quintos

Blog Farinha Amparo

O regresso nem sempre é pelo mesmo caminho


crica para visitares a página John & John de d!o

27 março 2010

Amor de puta: depois de mil "alguéns" ama alguém (II)

Claro que uma mulher que se prostitui também se apaixona. Que pergunta! Aliás, sempre se soube que o amor tem essa característica, a ironia e, se por todo o lado vai dando um ar de sua graça, nos lados a que não é chamado, quando se torna completamente inconveniente, quando tem nódoas de impossibilidade, dá um furacão de sua graça. Depois? Olhamos para ele, perfeita criatura, e perguntamos-lhe se, por acaso, não dará para guardar para tarde? Ri-se e, duas gargalhadas depois, instala-se na primeira fila e contempla entusiasmado. Claro que não se comove, segue de olhar atento, faminto de angústia apaixonada, o amante que agora se entrega ao descontrole cardíaco com que se confessa perdido e que, de vontade racional ajoelhada, (se) tenta convencer que sim, que é possível, que pode e conseguirá aceitar a partilha física da mulher amada, que é só a parte física, que os afectos são dele e que, vendo assim, se se concentrar muito nisso, até pode concluir que é o único que toca, verdadeiramente, a mulher querida. Vai tentar abstrair-se, não atribuir peso ou importância, ela é ela e ele ama e isso é o que realmente importa. Depois... talvez seja na primeira chamada não atendida. Que estará ela a fazer? E a imagem assalta, furiosa, nítida, com cheiro e som. Ciume. Dor. As perguntas rodopiam na cabeça. Quer saber. Não quer saber. Quer. Não quer. Ela chega ao fim da tarde. Um "como-foi-o-teu-dia-querida-?" é agora um drama. Sai disso, sai disso, sai disso. Não posso. Não posso. Não posso. Não quero. Não quero. Não quero. Não importa, nada me interessa, só tu. Não importa, nenhum me interessa, só tu. O amor cresce bem alimentado de afecto inchado de intensidade dramática, a carga emocional bem densa, tão típica dos amantes que se têm que agarrar com muita força. Ah, belo amor, diz-me, quanta pancada aguentas? Quantos corpos, quantos quartos alheios sugeridos à tua imaginação? Quantos corpos reais, surgidos por acidente, perante ti como amigos e familiares, já conhecem a mulher amada? E as dúvidas... Algum dia? Demora muito? Chegaremos lá? Voltará atrás? No meio de tantos, poderá conhecer um melhor? E o medo, o medo que nos descubram, que chegue a ouvidos alheios? Por isso, se ficares aí bem quietinho, senhor amor, não sou eu quem te vai buscar, não devo, não posso, não tenho promessas para fazer nem direcções para mostrar; nada, mesmo nada na mão que poderia estender. Posso, mas não devo, era tremendamente injusto. Se vieres sozinho, poupa-me a consciência o saber que tais coisas de tão grande vontade alheia a nós, não se permitem - mesmo que eu peça - guardarem-se para mais tarde, dominam o aqui e agora.

Museus do Sexo no Brasil

Descobri um blog brasileiro - museologando - onde a sua autora, Maíra Dias, mostra o resultado da sua pesquisa de museus do sexo no Brasil:

Museu da Sexualidade da Bahia (conhecido como Museu do Sexo) - "Funcionando provisoriamente na sede do Grupo Gay da Bahia desde 1999. O acervo conta com mais de 500 peças, sendo composto basicamente por cerâmicas eróticas do Nordeste, coleções de canecas oriundas de diversas partes do mundo, terracotas provenientes do Peru e México, de inspiração nas culturas Incaica, Asteca e Maia, esculturas em bronze e ferro da África Ocidental, porcelanas e metais da Holanda, França e outros países europeus, esculturas em metal e baixos relevos da Índia, cópias perfeitas de esculturas italianas das cidades de Pompéia e Herculano".

Há um "projeto da arquiteta Paula Posser, criado na sua monografia, do Complexo de Arte Erótica. Que incluiria, é claro, o Museu do Sexo!"

Museu Erótico de São Paulo - "funciona numa mansão nos Jardins (!) juntamente com uma locadora de vídeos e uma sex-shop".

"E finalmente descobri que o «Museu do Sexo» brasileiro é virtual! Idealizado pela Professora Carmita Abdo e bancado pela Pfizer! Em funcionamento desde 2003 tem um conteúdo interessante. Não gostei muito do layout da página, o que é compreensível por já ser um site «antigo». Mas o que não consegui entender de jeito nenhum foi usarem a Monalisa como símbolo... será que o mistério da Monalisa era outro?!"

Obrigada pelas dicas, Maíra Dias. Se um dia vieres a Portugal, estás convidada a visitar a minha colecção de arte erótica.

"Mãe, o que significa virgem?"

26 março 2010

O desarme (Take II)



HenriCartoon

Encomenda-me uma noite

Um restaurante quase vazio. Fim de almoço. Uma mulher e um homem.

– Mas as coisas são simples.
– Achas?
– São, acabam por poder ser: tu podes-me ter, é só quereres.
– Eu não te quero assim.
– Não?
– Não, assim não.
– Não me queres?
– A questão não está no querer. Eu quero-te. Quero-te ter. Quero beijar-te, sentir a tua pele, o teu calor, o teu cheiro... Sim, na verdade quero tudo isso e quero mais... Quero… Quero dar uma…
– Não digas!
– O quê?
– Isso.
– Mas eu quero-te. Quero-te.
– Não é isso.
– Não? Então é o quê?
– Queca, ias dizer queca. Ias dizer, quero dar uma queca contigo, não ias?
– Ia. Não me soou bem mas ia, pareceu-me que era menos…
– Queca soa-me a favor.
– A favor?
– Sim, a favor. Não gosto. Não gosto da palavra queca. Não me diz nada, queca é a palavra mais assexuada, mais desenxabida, mais desinteressante que há e o acto de dar uma queca é igual. É uma palavra triste e feia.
– É menos forte.
– É menos tudo.
– Posso voltar atrás?
– Podes.
– Eu quero foder contigo. Que me fodas. Que te foda.
– Sim… Então, se me queres, tens-me.
– Eu não te quero assim. E não é o querer, é a circunstância, a forma, o modo.
– Estás a complicar o que não necessita de complicações. Sabes o que faço. Sabes o que sou.
– Sei.
– Sempre soubeste.
– Sim.
– Nunca ficou nada por dizer, nem nada por perceber, pois não?
– Não, foi o que combinámos.
– Queres-me…
– Quero.
– Então, encomenda-me uma noite. Encomenda-me por uma noite e tens-me.
– Não te posso ter assim… Nunca te terei assim.
– Não me queres ter…
– Quero… Quero mas não assim, não te quero a pagar, não te quero comprar. Não quero pagar para ter o teu corpo. Quero ter-te. Quero ter-te inteiro. Quero ter-te como tu me terás a mim, toda!
– Mas… mas…
– Diz! Diz! Diz o que tens a dizer, diz! Não fomos nós que instituímos que nada ficaria por dizer? Que nada omitiríamos um ao outro? Que... Diz! Diz.
– Não digo nada, Carmen. Digo que tudo isto foi um erro. Um estúpido erro que ambos sabíamos que estávamos a cometer. Uma brincadeira de adolescentes que não podíamos ter, que não íamos aguentar.
– Eu aguento. Tanto aguento que estou aqui contigo. E sou eu que tenho coisas a perder. Sou eu que sou casada, Raul, sou eu que tenho marido e filhos e sou eu que estou a almoçar com um acompanhante. Contigo, Raul, contigo.
– Foste tu que quiseste. Foste tu que, sabendo o que eu faço, o que eu sou, te quiseste aproximar de mim. Foste tu que disseste que não ias trair o teu marido, que só me querias conhecer, que me querias conhecer como outra pessoa qualquer.
– E tu quiseste a realidade, a realidade de uma mulher real, de uma mulher diferente das mulheres que te pagam para as foderes…
– Todas as mulheres são reais, Carmen, e se me procuram é porque precisam de mim…
– De ti, do teu corpo, do teu caralho…
– Estás enganada. As mulheres que me pagam precisam que eu as deseje, precisam que eu as queira, precisam que eu, enquanto estamos juntos, me preocupe com elas, com os seus desejos, com os seus gostos e vontades. Precisam do meu sorriso, da minha atenção…
– E que as fodas…
– E que as foda, claro. Que as foda bem, que as foda como não as fodem. É o meu trabalho, Carmen, é o meu trabalho e tu sempre o soubeste.
– Mas nós…
– Não há nós, Carmen. Ou melhor, há nós aqui, nós a tomar café, nós a lanchar, a conversar, a trocar mensagens. Nós a rirmo-nos de nós, nós… mas não há mais nós do que isso. Não há esse nós, não pode haver.
– Não queres que haja.
– Não quero.
– Não queres mas se eu quiser, comp… Encomendo-te por uma noite, não é?
– Não. Agora não. Não ia ser bom para qualquer de nós. Era mais um erro sobre o erro que já cometemos.
– Não me fodias mesmo que eu te pagasse?! Sou assim tão repulsiva?
– Não, não tem nada que ver com isso.
– Não?! Como é que explicas que homem não queira uma mulher?! Como é que explicas que um homem não queira uma mulher que lhe paga para a comer?
– Porque…
– Não digas que é por gostares de mim ou por me respeitares ou… ou o caralho! Não me digas nada, foda-se! Não me digas nada!
– Tenho que dizer, Carmen…
– Eu não me chamo Carmen.
– O quê?!
– Eu não me chamo Carmen.
– Não?!
– Tal como tu não te chamas Raul.
– Não?!
– Chamas-te?
– Raul?
– Sim.
– Não.
– Chamas-te António.
– E tu?
– Eu não.
– Tu não, o quê?
– Não me chamo António.
– Não pensava que te chamasses António.
– Chamo-me Ana.
– Ana?! Ana?! Não te chamas mesmo Carmen?
– Não, chamo-me Ana, Ana Maria.
– Ana Maria?!
– Sim, Ana Maria.
– Ana Maria?!
– E tu, foda-se?! Mas que merda de nome é esse? Achas que Raul é mais macho, é?
– Ana Maria… Raul é o meu nome… é o meu…
– É o teu nome artístico.
– Pois, não gosto de António. Nunca gostei. Nem de Ana Maria, se queres saber.
– Não quero mas já tinha reparado… Uma careta bastava…
– Uma careta?
– Sim, bastava uma, não era preciso fazeres uma careta de cada vez que repetias Ana Maria.
– Eu… Eu não…
– Não interessa… Não interessa nada… Não interessa mesmo nada… Sabes, acho que afinal eu… Afinal eu era, eu sou!, uma mulher como as outras. Uma mulher como todas as outras.
– Eu não acho isso.
– Eu também queria a tua atenção, o teu sorriso. Eu também queria que tu me quisesses, que te lembrasses de mim, que te preocupasses comigo enquanto estás comigo, que tivesses atenção aos meus gostos, aos meus desejos… Sou igual.
– Não és.
– Não?!
– Não.
– Não quis, ou melhor, não quero. Não quero eu também o teu corpo, o teu caralho dentro de mim?... Estúpida! Sabes o que eu sou?
– Não és.
– Sou. Sou estúpida. Sou estúpida e tenho a mania que é o meu cérebro que manda…

Um empregado aproxima-se, todo vénias e mesuras, pede desculpas, pergunta se querem mais alguma coisa, repete as desculpas, agradece a resposta negativa e informa que vai tirar a conta. Afasta-se.

Ela segura na mala, que pousa nas pernas, hesita sem se mover e decide:
– Adeus, Raul. Obrigado.
Ele olha-a, sem reacção, vê-a levantar-se, rodear a mesa, beijá-lo no rosto e despedir-se:
– E obrigado pelo almoço, Raul. Adeus.

Na serra


Passeámos de carro
à procura de um local tranquilo,
suficientemente longe,
para não termos surpresas
desagradáveis
ou encontros fortuitos.

Nos confins da serra,
num caminho de terra
escondidos de olhares,
tratámos de dar largas
à nossa vontade.

A partir daqui
É a vossa imaginação.

Foto e poesia de Paula Raposo

Adormeci...

Adormeci
tenho sonos entre dedos e noites
nas mãos cheias de madrugadas;
adormeci sem ti, madrugadas desoladas
acordei sem ti, madrugadas estremunhadas
dormi em ti, madrugadas sonhadas
ainda sou eu, de estrelas adormecidas.

Adormeci
continuo a dormir num corpo de estrelas cadentes
e nas mãos adormecidas sonho de ti os poemas
acordo em ti, beijas-me a noite que acordas
sonho em ti, acordas-me do sonho que chamas
sonho sem ti, não entendo as palavras desencantadas
ainda és tu, foste tu em todas as vidas.


Safadeza

Cuidado, meninas! Vocês que vão a academia para ficarem saradas, magrinhas e belas, não sabem os perigos que rondam por lá. Ou vocês acham que todos os homens que estão na academia vão lá só para se exercitar?!
Desconfie sempre…


… principalmente de caras com óculos escuros e fazendo abdominais.

Capinaremos.com

O apresentador moderno



HenriCartoon

25 março 2010

Submissão?


A posta sem espinhas

Já aqui abordei em diversas ocasiões as várias costelas de gaja que vou encontrando ou os outros (as outras, queria eu dizer...) descobrem em mim. Sim, cometo uma heresia aos olhos dos machões viris para quem qualquer traço de feminilidade equivale a falta de tesão.
Mas não, precisamente por estar à vontade sabendo que nada tenho a declarar (a murchar?) nessa matéria é que posso dar o corpo ao manifesto sem temer a perda de prestígio junto dos mais preconceituosos do meu género. Ou do outro.
Claro que, mais uma vez, ninguém tem nada a ver com as tais características femininas que me tornam híbrido nalgumas matérias, sobretudo no plano emocional, embora não bastem para me confundir nas escolhas e ainda menos nas horas da verdade que a vida generosa sempre teve o cuidado de me proporcionar.
Todavia, um blogue pessoal deve ser intimista. Pelo menos na minha concepção da coisa, onde só vale a pena um gajo dar a cara sem tema concreto se tiver os tomates necessários para se expor aqui e além às reacções que tanto podem vir dos machões acima citados como das insuspeitas leitoras que por vezes também aí se revelam mais machonas até do que eu...
Tudo isto para vos dizer que sim, tenho no meu carácter de gajo hetero algumas miudezas que várias moças identificaram de imediato como coisas de gaja. É difícil precisar quais são exactamente, pois manifestam-se em situações esporádicas e não são, de todo, racionais mas instintivas. Mas são coisas pequenas, adianto, e em nada (espero) afectam a minha imagem máscula junto do belo sexo e ainda menos (felizmente!) diminuem o entusiasmo que me caracteriza nos contactos mais próximos com essas fontes de vida como as entendo.
Ou seja, mais importante do que a súmula desses pecados de traição à combinação dos cromossomas, detalhes, é a minha forma de os interpretar.
E eu interpreto-os como uma honra e um privilégio, nada menos, precisamente pela ideia que tenho das mulheres e nunca aqui a escondi.
Embora não faltem estafermos sem pila, o padrão que sigo aplica-se à maioria e olho para elas com muito maior admiração do que para eles. E isso nem tem a ver directamente com a minha clara tendência hetero mas sim com o reconhecimento dos factos.
Poucos, mesmo poucos, homens conseguiram impressionar-me como a maioria das mulheres que conheci. São uns básicos, quase todos, e andam a leste do paraíso que elas possuem para explorar (sim, no corpo também...) nas suas mentes complexas e sensibilidades extremadas.
As mulheres, no meu modesto entendimento de mero apreciador do género, são criaturas especiais e diferentes para melhor em tudo o que verdadeiramente interessa.
Podia ter dito isto tudo em dois parágrafos, claro, mas queria certificar-me de que ficam a saber que não só em nada me confrange constatar esses detalhes efeminados no pensar e nas reacções (e na cama também, mas acho que apenas na sensibilidade cutânea e quiçá na desenvoltura linguística), como me orgulho de possuir tais características por me fazerem sentir um pouco mais próximo da perfeição como a concebo.
É disso que se trata. Tinha que o referir, sob pena de ficar com alguma coisa atravessada na garganta. Mas essa experiência, desencantem-se os que me prefeririam ainda mais exposto ao proverbial “eu sabia...” que estas confissões podem suscitar, até hoje nunca vivi.
Tirando uma espinha de safio ou duas, ok...

Inventei...

Inventei
o teu beijo no meu ombro;
sim, ainda procuro
memórias que não inventei
da tua mão no meu cabelo;
no teu colo sosseguei
e inventei
e da minha casa fiz castelo;
sim, inventei esta verdade
para enganar a saudade
de corpo pálido de pesadelo
que no teu rosto acalmei.
Inventei-te
num sussurro de peito aberto,
suspiro pequeno, nu, descoberto
e canoas nos meus olhos
inventam mar nos teus dedos;
não veio a onda e chorei.
Inventei-te
e tanto te esperei,
meu amor, que já nem sei
se apenas te inventei.




A cabeça no ar da Maria de Lurdes teve como resultado que todos os pilotos ficaram na pole-position.

24 março 2010

Chatroulette...

... clerical

Prostituição: carta aberta. Pela recusa da aceitação condicionada. Pela dignidade.

Não existem duas mulheres numa só, a separação entre a mulher e a prostituta é uma fantasia que existe para permitir alguma distância da realidade. Na verdade, quando me dizem que só me estão a ver a mim e não a Joana, que é por mim o afecto, não entendo, não entendo. Porque somos a mesma, não posso deixar uma em casa. Aliás, nem somos a mesma, sou eu e eu sou só uma. Não existe capacidade de extrair o que faço no meu dia a dia de mim, como se fosse um personagem que encarna e que fica separado através de qualquer espécie de exorcismo ou corte. Quantas pessoas já me disseram que querem conhecer a mulher e não a mulher prostituta. Como se eu fosse o que faço e, como tal, duas. Nalguns casos, penso que apenas me estão a tentar explicar, de uma forma um pouco trapalhona - conta a intenção - que, contudo, se entende, que me querem conhecer mas que não pretendem contratar os meus serviços; ainda assim - infelizmente - muitas vezes essa curiosidade tem a ver quase unicamente com o facto de eu ser prostituta, é uma definição de interesse que encaixo entre o voyeurismo, a curiosidade mórbida e uma qualquer espécie estranha de fascínio; ainda nesta categoria, posso encaixar os que pretendem simplesmente seduzir-me recorrendo a clichés que julgam bonitos e atordoantes, como se fossem espécimes extraordinários e sensíveis por serem capazes de - alegadamente - separar a prostituta de mim. Noutros casos, e estes referem-se às pessoas que já me conhecem, trata-se de uma qualquer necessidade de separação que me ultrapassa. Porque serve para nada. Eu continuo a ser eu e a ter a mesma profissão. Tentam que me sinta mais confortável? Não me sinto. Quando me escancaram essa separação, fico apenas intrigada e perplexa. Para quê? Altera quem sou, aquilo que faço? Não, claro que não. Então porquê essa tentativa de separar? Para se distanciarem da prostituta? Para distanciarem a prostituta de vós? Sou eu, sou eu. Sou eu que me prostituo e quem se prostitui sou eu, mulher e pessoa única. Se é por mim, evitem, apenas me faz revirar os olhos. Se é por vós, acreditem que sou só eu, não fica a outra em casa, se vos incomoda: evitem-ME... Transformarem-me em duas e uma ser aquilo que faço para poderem extrair o que não vos agrada ou incomoda, dificilmente se pode confundir com aceitarem-me, com não ter importância a minha actividade, com gostarem de mim como sou. Claro que não tenho qualquer necessidade de vos gritar orgulhosamente a minha profissão como se fosse a bandeira nova do meu País; o que eu grito orgulhosamente é: ACEITO-ME! E tu? Não, não se trata de retórica; trata-se de dignidade. E dignidade é algo que, aqui, se tem que agarrar com os dedos todos; é que, além de ficar mais escorregadia, mais frágil e mais sensível, existe um Mundo de gente que, com ou sem intenção, lhe dá uns puxões.


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Cartas abertas anteriores que podem ser lidas também na revista online FreeZone:
Prostituição: carta aberta e
Prostituição: porta de saída

Postalinho do Brasil

Lembram-se do poema «Autoputaria», de Ildásio Tavares, que publicámos aqui e deu origem a uma cascata de poemas?
Pois o Ildásio escreveu-me agora este postalinho:

"São rosas cheirosas;
são rosas eternas
as rosas gostosas
que tens entre as pernas

Menina linda, tenho uma porção de poemas eróticos dispersos, Vou procurar.
Por enquanto esses dois sonetos:

Soneto do Amor

Amar é foder;
foder é amar,
Não há mais querer
nem que desejar,

Foder é sublime,
espiritual.
Foder só é crime
se alguém fode mal.

A foda que enleva
de excelso fervor
as almas eleva

perfume de flor,
delírio na treva,
foder é amor.

Soneto da Cópula Sublime
para a classe e pudor de minha amada

Como é sublime quando nós fodemos
e meto a minha pica em sua boceta
toda melada a antegozar que eu meta
e plenos de prazer nós dois gememos.

É só fodendo que no amor vivemos
como o arco possui a sua seta;
como a chave que gira na gaveta;
nós dois, num corpo só nos envolvemos.

E fodemos com gosto e com suor:
pica e boceta já sabem de cor
o caminho do fogo e fantasia.

Tu me chupas, te chupo com tesão;
e te meto meu pau até o colhão,
na mais doce e sagrada putaria.

17.VII.2009
Itapuã 6

Lindíssima miúda, Beijos nas rosas
Ildásio Tavares"

Peça única em bronze de P. Leroux

Digam lá que não é um miminho, esta estatueta em bronze!
Tem 25 cm de altura e pesa 1,65 Kg.
Que bem que fica, a partir de agora, na minha colecção...






Lucía, gabinete de sexologia -"O homem do gás"

Mais uma história do livro «Lucía, gabinete de sexologia», com a autorização de publicação pela editora el Jueves:




23 março 2010

Selecção feminina rumo ao mundial 2011



HenriCartoon

A minha passagem pelo Estabelecimento Prisional da Guarda

Um técnico de informática é um indivíduo extremamente injustiçado. Dado a horários laborais que, não raras vezes, diferem muito do horário laboral de 8 horas diárias dos "comuns mortais", são muitas vezes vistos apenas como "o tipo que vem limpar o computador". Ora, na verdade, a profundidade da tarefa do técnico vai muito para além desta análise superficial e tem um impacto social muito mais abrangente do que se pensa.


Quando há uns bons anos atrás laborava na cidade da Guarda como técnico de informática, fui incumbido de uma tarefa que, sendo comum, teria de ser realizada num ambiente ao qual estava pouco habituado: o Estabelecimento Prisional da Guarda. Se a perspectiva de entrar numa prisão já de si era suficiente para me deixar nervoso, mais ainda fiquei quando, à entrada, fui revistado e todas as caixas que levava comigo foram cuidadosamente inspeccionadas (apesar de, por lapso, me terem deixado entrar com o telemóvel).
Já agora, a minha missão consistia em... ligar os computadores de uma sala de aula à Internet, por muito estranho que isso possa parecer até porque, imaginei eu, isso poderia dar azo a que circulassem e-mails como "Jojó, lanxa 1 corda amanhã pertuh do muro Xudoexte às 14h00".
Procurando ignorar estes pensamentos e o nervosismo, entrei no edifício principal acompanhado por um guarda e, carregado de material, passei pelo meio dos "residentes" que estavam sentados na escadaria e que só a pedido firme da minha escolta abriram passagem, embora com uma nítida animosidade para com ela.
Ao chegar à porta da sala, o guarda bateu à porta e entrou. Pelo que percebi, estava a decorrer uma aula de matemática ou de geometria, tendo em conta as figuras que estavam desenhadas no quadro. Perante o anúncio de que estava ali o técnico para ligar os computadores à Internet, a aula foi dada como terminada e todos os alunos começaram a sair ordeiramente.
Nisto, um deles abeirou-se de mim e perguntou:
- "Vamos ter Internet?", ao que respondi que sim, que iam ter Internet.
É difícil descrever o ar de alegria que então despontou no seu rosto quando, de olhos bem abertos e com uma voz de indisfarçável emoção, quiçá com uma certa dose de avidez, me atirou imediatamente:
- "Vamos ver gajas??????"
Naquele momento, percebi a importância da minha tarefa. Qual arauto da esperança, eu estava ali para proporcionar, a todos aqueles homens, um lampejo de felicidade e a criar condições para tornar a sua estadia mais suportável, algo que se revestiria de uma importância ainda mais transcendental caso o Jojó não aparecesse com a corda junto ao muro Sudoeste.
Foi este sentimento que me confortou enquanto trabalhava sozinho na sala, ouvindo de parte incerta o som de um bastão a percorrer as grades da secção de alojamento.


Este é mais um simultâneo A Funda São - Blog do Katano*

* Já agora, pedindo desculpa pela ousadia, venho apelar ao voto no Blog do Katano no concurso Super Blog Awards. Actualmente no 4º lugar do ranking (passam os primeiros 5 à próxima fase) as próximas horas anunciam-se renhidas e cada voto conta. Cliquem aqui: http://tinyurl.com/yezcdpa, registem-se e votem! Já agora, sugiro também um voto no blog Câimbras Mentais, da Ana, http://tinyurl.com/ye2gjym.

Serei


Hoje: serei a mais bela mulher da sala.

Semicerrarei os olhos brilhantes
e entreabrirei os lábios húmidos
quando tu subires ao palco
e me dedicares aquela música
que escreveste quando eu adormecia
(de tédio) na tua cama desfeita.

Hoje: serei a mais bela mulher da sala (!)

Recordarei sem mágoa
o momento imperfeito das semifusas
enquanto compunhas -fanático-
aquilo a que chamavas a tua ascensão(!)
e envolver-me-ei (mais uma vez)
na invulgaridade arranhada.

Hoje: serei a mais bela mulher da sala (?)

Não para ti.
Felizmente:
a sala esvaziou-se em atropelos
dessincronizados.

Para mim.
Também felizmente:
a sala encheu-se de vozes,
de luzes e de tudo o que mereço
para além deste presente.

Foto e poesia de Paula Raposo

Conto circular

Estás aqui? São tantas as vezes que te faço a mesma pergunta; sabes que a faço mesmo que os meus olhos me respondam? Sabes o que te estou a perguntar? Escuta-me porque eu digo-te tudo, sempre te digo tudo e acho que o tudo que te digo é sempre o mesmo. Escuta-me, eu não posso falar mais alto, eu nem sequer grito; eu não posso gritar palavras que gritam, elas ficam no ar e não são balões e eu aqui, com medo, sempre com medo que te caiam em cima, que te assustem, que choquem contigo porque não viste que as lancei na tua direcção, porque não as agarraste. Escuta-me, fico aqui e agarro-as de volta e arrependo-me e lanço-as novamente; olhas-me com o efeito do vácuo das tuas palavras cautelosas e eu fico a repetir o gesto até ao infinito. Demora-te nas minhas pernas; dizem tantas coisas quando encontram as tuas, o joelho toca no teu e milhares de palavras engolem a voz de dois mudos; deixa a redoma empalidecer até ter a cor das tuas mãos. Sim, escuta, lembrei-me agora: não, não estás. Não estás, apenas me fazes esquecer, por momentos, que não estás. É o que fazemos, quando as pernas se tocam e enrolam, esquecer que não somos e que só estamos dentro da redoma dos minutos que fogem. Estranho, tão estranho, não estás aqui.

Lady Gaga - «Telephone ft. Beyoncé»



Bainha da espada


2 páginas - basta cricares em "next page" a partir da página inicial acima

oglaf.com

22 março 2010

Sonhos de um corpo nu


É de manhã que eu me visto
Com os sonhos imaginados.
Traço nos olhos um risco delicado
Feito da luz que adorna a minha sede de sonhar.

Bate o tempo
Nesta espera inquieta
Deliciosa e provocadora
Tentação aos meus sentidos

Voam sussurros
Que o sonho canta
Fios entrelaçados
Dos lábios humedecidos

Voraz desejo que desespera
Vontade rouca e sincera
De envolver este sonho
Na paz de um amor puro

À noite,
Reinvento os sonhos de dia trajados
Sob a luz da lua
Por mim
Repetidamente sonhados.



Maria Escritos
http://escritosepoesia.blogspot.com/

Penas

Estás aí? Preciso que me acalmes, a língua sabe-me ao metal do medo. Só desta vez. Não me fales dos perigos, mostra-me as espadas. Desnudar a fragilidade. Esticar o peito, mostrar o pânico entre penas. Tenho tanto medo, tenho tanto medo, tenho tanto medo. Já está. Abri as asas, deixei cair a armadura, era pesada demais para saltar do ninho. É a minha espada, agora, ser. Nem que seja um enorme ai. Estou a tremer. Continuo a andar. Não me escondo mais, conseguem ver que estou a tremer mas não faz mal; todos os pássaros tremem e podem voar com a beleza digna de quem serenamente aceita todas as emoções. Vou saltar. É alto, eu sei, mas não me digas que vou cair, não me faças ficar. A tua certeza da queda é a minha queda certa. Mesmo que tenhas a certeza, sopra-me as asas e fica a ver-me cair, se assim é. Prefiro que beijes a dor em todas as penas que quebre. E que me ensines como ir mais alto. Estás aqui?


Dança do ventre - por Lorena Rossi



O OrCa, quando vê um umbigo feminino, ode logo:

"bela dança - belly dance
ou dizer, quiçá, à outrance
que ela dança sem que dance
e quase pança não pense
que o passe-partout incense
e vele o que o véu acende
no olhar que assim se estende
pr'álem do que o olhar entende
dos sentidos já sem tino
que ela dance e relance
o seu olhar desatino
e seios - coxas - o ventre
entre nós por nós se adentre
a acender-nos o destino...

Ou numa abordagem mais afadistada:

e como montar tal sela
ou ser por ela montado
sem de pronto saltar dela
e ficar todo alquebrado?"


O Bartolomeu contraode:

"Qual alquebrado, qual carapuça!
Português que é Português
Tanto monta Turca como Russa
Quer dê pulos, ou se torça
Venham uma de cada vez
Que não lhe faltará a força!
Mas se vierem às dúzias
Com muita música e véus
E todas bem aparelhadas
Depressa nos levam aos céus
E recebem umas fodas bem dadas!
Digo eu... em Turco... e assim..."

Rapidinha


Alexandre Affonso - nadaver.com