Hoje não posso responder a ninguém. O homem no meio da sala fala demasiado alto e atordoa a multidão. Tantos eus aqui comigo, tantos. Esta é a imagem da minha confusão. A verdade encontra-me sempre incapaz de acreditar e, ao mesmo tempo, incapaz de me mover como uma céptica. Não me movo. O homem deita-me. Adormeço e acordo deitada, o homem em cima de mim tenta observar a multidão; de vez em quando, estica o braço e pega, meigo, tão meigo, num dos pequenos eus e vai pousá-lo, cuidadosamente, separado da multidão. Dá-lhe um pequeno beijo e pede-lhe que não volte a entrar, que não será bem vindo, que não cabe na perfeição, que está tudo muito melhor assim, que só mais um ou dois como ele e as grades poderão cerrar-se à minha volta e dar-lhe a maravilha da tranquilidade perante mim: não mais causarei dor! Os pequenos eus rodeiam-me, tristes, estáticos, confusos; abrem muito os olhos partidos, muito, muito, até ao tamanho deles, até ao tamanho do vazio aqui. São apenas pequenas crianças perdidas, nem a mãe os soube guardar. Olham o homem pequeno - agora tão pequeno, mais pequeno que eles - do tamanho da cobardia. Vou salvá-los a todos, alguns perdem pedaços, já se calou o homem, já nem vejo o homem, mas eles salvam-me a mim. Esperarei quem enfrente e aceite os meus eus, tal como eu, porque eles não se podem separar de mim sem que eu deixe de ser porque eu quero pouco, tão pouco, quem me queira por quem eu nem sequer sou. Hoje não posso responder a ninguém, estou a falar comigo, como sempre, em paz.
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Uma por dia tira a azia