15 fevereiro 2013

Oral

– Eu perguntei-lhe: “E que tal se me fizesses um fellatio enquanto lavo os dentes?” e ela respondeu-me: “Não há pasta.”
– E não havia?
– O quê?
– Pasta de dentes.
– Sei lá. Achas que isso é importante?
– Sim, se tu querias que ela to fizesse enquanto lavavas os dentes…
– Mas eu respondi-lhe: “Lavo só com a escova.”
– Mas isso não é lavar os dentes, é escovar…
– Isso foi o que ela disse.
– Foi?
– Foi.
– E tu?
– Eu reformulei a questão: “E que tal se me fizesses um fellatio enquanto escovo os dentes?”
– E ela?
– Ela olhou para mim como se eu tivesse melancias presas às orelhas e perguntou-me…
– Como é que é isso?!
– O quê?
– Uma pessoa olhar para outra como se aquela para quem ela olha tivesse melancias presas às orelhas?
– É um olhar entre a perplexidade e o desencanto.
– Se eu tivesse melancias presas às orelhas tu olhavas para mim com um olhar entre a perplexidade e o desencanto?
– Provavelmente.
– Estás a gozar!
– Tu queres saber o resto da história ou não?
– Tu é que disseste que a mulher olhou para ti como se tivesses melancias presas…
– Às orelhas, eu sei, mas isso não interessa nada!
– Então, o que é que ela te perguntou?
– “Trouxeste escova?”
– Eu?
– Não! Ela! Ela é que me perguntou se eu tinha levado escova de dentes.
– Ah!… E tinhas?
– Não.
– Não estou a perceber nada… Mas, afinal, tu querias lavar os dentes?
– Não.
– Então, porque é que falaste nisso?
– Sei lá, lembrei-me. Achei que era engraçado.
– O quê? Dizê-lo só ou que ela to fizesse enquanto tu o fazias?
– Sei lá, dizê-lo. Eu queria é que ela mo fizesse, se era a lavar os dentes ou a fazer outra coisa qualquer era-me totalmente indiferente.
– Mas tu tinhas de estar a fazer alguma coisa, é isso?
– Não.
– Tu é que disseste…
– Eu sei. Já percebi. Mas não tinha de estar a fazer nada. Queria é que ela mo fizesse.
– Um fellatio.
– Sim.
– E ela falava latim?
– Sei lá se ela falava… Não, não falava.
– Como é que sabes?
– Porque eu disse-lhe: “O melhor é esquecermos a minha higiene dentária e fazeres-me só o fellatio.”
– Disseste isso, assim?
– Disse.
– E ela?
– Disse-me que eu nunca devia esquecer a higiene dentária, que isso era muito importante; que tinha sido assistente de um dentista e que as pessoas não faziam ideia do estado em que as outras pessoas tinham a boca e que se soubessem nem se beijavam ou que, pelo menos, se tivessem sequer uma ideia, de certeza que não enfiavam as línguas nas bocas umas das outras; e que quando as pessoas desprezam ou omitem a higiene oral ou mesmo que quando só facilitam podem vir a ter muitos tormentos, tribulações e padecimentos…
– Ela disse isso? Assim?
– Foi, foi mesmo assim e continuou e, no fim, perguntou-me se eu ainda queria o fellatio e quando eu lhe disse que sim, perguntou-me “Onde?” e eu respondi, “Pode ser aqui”, e ela olhou para mim e perguntou-me como é que isso se fazia.
– Ela não sabia o que era?
– Não.
– Então, porque é que te disse que não havia pasta de dentes?
– Se calhar porque eu disse que os queria lavar.
– Se calhar… E explicaste-lhe?
– O quê?
– O que era o fellatio.
– Sim, disse-lhe o que era.
– E ela fez-te?
– Eu já não quis.
– E ela?
– Também não fez questão.