04 fevereiro 2013

Luís Gaspar lê «Nádega» de David Mourão-Ferreira

"Entre as duas nádegas

o pávido sulco
tem aroma de áfricas 

e de uvas de outubro

Dirias que fora

um silvo de morte 

a penetrar toda
a nocturna flora
até hoje intacta
que ainda aí tinhas


Respira Não fales

Murmura Não grites

Que travo
de amoras

Que túnel escuro
Que paz no que sofres

por mais uns minutos

o pescoço vergas 

submissa e frágil

tal o de uma
égua 
que vai beber
água
mas encontra a
lua 


E junto da cama
a rosa viúva
com lágrimas brancas
já pede os meus dedos

sacudido apoio
para a viuvez
em que a deixo hoje

Muito mais a
norte 
os queixumes
calas
E nem gemes Gozas

enquanto te invade
o suco da vara 

vertido no sulco

Vê como foi fácil

Respira mais
fundo"
David Mourão-Ferreira

Ouçam este poema na voz d'ouro de Luís Gaspar, no Estúdio Raposa