O episódio custou-me mas nunca ninguém soube. Evitou-se, à tangente, uma tragédia de proporções bíblicas, pois, o Oliveira manteve-se sempre a rondar.
A muito arranjada contribuinta senta-se à minha frente e sorri. Eu retribuo.
– Não sei se o senhor me pode ajudar... – diz ela num sensual fio de voz.
– Posso, com certeza. – Interrompo-a eu, inchando o peito como um pombo a fazer a corte. – Em tudo o que a senhora precisar.
– Oh, não diga isso... – A frase, o tom e o gesto de vergonha fingida foi um bocado exagerado mas eu tomei o episódio como um incentivo.
– Digo e digo-o outra vez. – Tornei-me também demasiado explícito. – Disponha de mim como e quando quiser.
– Obrigado – ela sorriu como se estivesse habituada a ver os homens dissolverem-se em testosterona. – Na verdade, o que tenho a pedir-lhe é muito simples: perdi o meu cartão de contribuinte.
– Sim, senhora. Às vezes, os pedidos mais simples são os mais importantes. E as pessoas que se preocupam com as coisas simples da vida, são as que lhe dão mais valor. – A gaja bebia as minhas palavras. Conversa da treta e ela sorria como se estivesse a ouvir os concertos para (o) violino de Chopin. – Por acaso, não sabe o seu número de identificação fiscal?
– O meu... – ela suspendeu a frase e apenas com o olhar pediu-me ajuda.
– Ah! Desculpe, é calão técnico-fiscal. Queria saber se a senhora sabe o seu número de contribuinte.
– Oh! O número de contribuinte... – suspirou ela. "Demasiadamente melodramática", pensei. – Sei, é o 123...
– Sim, senhora, ajuda-me muito. Vamos já tratar disso – e digitei o número. Li o resultado. – Deve-se ter enganado. Importa-se de repetir?
Ela repete e eu torno a digitar, com o mesmo resultado.
– Não pode ser. A senhora está enganada, desculpe. Este número está em nome de um tal Augusto...
– Augusto António da C... P... G... – interrompeu ela.
– Exactamente – disse, surpreendido com a prontidão e certeza da resposta dela. – Esta confusão já tem acontecido outras vezes?
– Sim – ela sorriu. – Pode-se dizer que sim.
– Então não se lembra do seu número? – Perguntei eu inocentemente. Totó.
– Esse é o meu número – disse ela.
– Ah!... – Devo ter ficado de todas as cores. Ela sorriu de uma forma tão natural que me envergonhei ainda mais. – Sim, senhor...a, é o cartão de contribuinte que quer. Muito bem. Sim, senhor...a. Vou já tratar disso.
E tratei e ninguém percebeu (nem eu) e despedi-me educadamente.
– Porra, "ganda" avião! – Veio o Oliveira dizer-me logo que ela se levantou.
– Artilhado, ó Oliveira. Todo artilhado!
Garfanho
A muito arranjada contribuinta senta-se à minha frente e sorri. Eu retribuo.
– Não sei se o senhor me pode ajudar... – diz ela num sensual fio de voz.
– Posso, com certeza. – Interrompo-a eu, inchando o peito como um pombo a fazer a corte. – Em tudo o que a senhora precisar.
– Oh, não diga isso... – A frase, o tom e o gesto de vergonha fingida foi um bocado exagerado mas eu tomei o episódio como um incentivo.
– Digo e digo-o outra vez. – Tornei-me também demasiado explícito. – Disponha de mim como e quando quiser.
– Obrigado – ela sorriu como se estivesse habituada a ver os homens dissolverem-se em testosterona. – Na verdade, o que tenho a pedir-lhe é muito simples: perdi o meu cartão de contribuinte.
– Sim, senhora. Às vezes, os pedidos mais simples são os mais importantes. E as pessoas que se preocupam com as coisas simples da vida, são as que lhe dão mais valor. – A gaja bebia as minhas palavras. Conversa da treta e ela sorria como se estivesse a ouvir os concertos para (o) violino de Chopin. – Por acaso, não sabe o seu número de identificação fiscal?
– O meu... – ela suspendeu a frase e apenas com o olhar pediu-me ajuda.
– Ah! Desculpe, é calão técnico-fiscal. Queria saber se a senhora sabe o seu número de contribuinte.
– Oh! O número de contribuinte... – suspirou ela. "Demasiadamente melodramática", pensei. – Sei, é o 123...
– Sim, senhora, ajuda-me muito. Vamos já tratar disso – e digitei o número. Li o resultado. – Deve-se ter enganado. Importa-se de repetir?
Ela repete e eu torno a digitar, com o mesmo resultado.
– Não pode ser. A senhora está enganada, desculpe. Este número está em nome de um tal Augusto...
– Augusto António da C... P... G... – interrompeu ela.
– Exactamente – disse, surpreendido com a prontidão e certeza da resposta dela. – Esta confusão já tem acontecido outras vezes?
– Sim – ela sorriu. – Pode-se dizer que sim.
– Então não se lembra do seu número? – Perguntei eu inocentemente. Totó.
– Esse é o meu número – disse ela.
– Ah!... – Devo ter ficado de todas as cores. Ela sorriu de uma forma tão natural que me envergonhei ainda mais. – Sim, senhor...a, é o cartão de contribuinte que quer. Muito bem. Sim, senhor...a. Vou já tratar disso.
E tratei e ninguém percebeu (nem eu) e despedi-me educadamente.
– Porra, "ganda" avião! – Veio o Oliveira dizer-me logo que ela se levantou.
– Artilhado, ó Oliveira. Todo artilhado!
Garfanho
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