13 fevereiro 2005

Geração

Porque insistes Manela para que te conte do Luís, esse filho do pós-guerra?... Soubeste logo na altura que ele era muito mais velho que eu e que, como tal, também esteve na Colonial, a do boom dos mulatos, apesar da cânfora que misturavam no vinho, mas o instinto de sobrevivência é uma coisa lixada, Manela!...
Fazia todas as mesuras próprias da sua geração. Abria-me a porta do carro para entrar, enchia-me de chocolates belgas e de caramelos de Badajoz, lingerie preta com muito fio dental e flores embrulhadas em jantares, à luz de um tinto alentejano. Bebia sumo de laranja natural logo pela manhã para se atestar de vitaminas e à noite, conservava-se em álcool, com a ajuda de qualquer uísque com mais de doze anitos e sem pedra de gelo.
Mas tenho de reconhecer, Manela, que no acto o Luís se esforçava por pronunciar o meu nome e não dizer aquelas coisas corriqueiras como linda, amor, querida ou - o supremo mau gosto - de filha.
E o que correu mal, Manela?!... Ora, fica sabendo que o homem engravidou uma miúda de 18 aninhos e lhe deu uma paisite aguda. Eu cá adorei assistir àquele casamento numa igreja engalanada, vendo-o de fato e gravata cor de pérola e a noiva toda de branquinho com um véu descomunal a que só faltava a canção do Trio Odemira. E ainda dizem que as mulheres é que são lamechas, Manela!

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