29 setembro 2010

«O pecado original» - por Rui Felício


A História de Adão e Eva (ou as razões por que nunca compreendi esta história...)
As dúvidas que a seguir exponho não são condicionadas pelo facto de sermos crentes, agnósticos ou ateus. Não é isso que está em causa, mas tão só a análise dos livros sagrados que, queira-se ou não, influenciaram e influenciam, para o bem e para o mal, as civilizações deste mundo.
Adão e Eva, segundo os livros sagrados do judaísmo, do islamismo e do cristianismo, foram a suprema obra de Deus que, ao sexto dia, com eles culminou a sua criação do mundo. Únicos seres a quem concedeu uma alma.
Colocou-os no Paraíso, onde lhes prometeu uma vida eterna, feliz e livre de todas as agruras, dificuldades e sofrimento.
Apesar de serem insondáveis os desígnios divinos, não compreendo que a criação de Adão e Eva como seres perfeitos, imunes e desconhecedores do pecado e da maldade, tenha ficado sujeita a um teste, para mim inexplicável, que consistiu no cumprimento escrupuloso da proibição de tocarem ou de se servirem dos frutos da árvore da ciência, continente da percepção e conhecimento dos conceitos do bem e do mal.
De facto, Deus é caracterizado em todos os livros sagrados como um ser infinitamente perfeito, omnipotente, misericordioso e bom. Poderia portanto, se quisesse, ter mantido o homem e a mulher eternamente perfeitos, sem necessidade de os sujeitar a qualquer teste.
Porque lhes proibiu então o acesso à árvore da ciência? Ameaçando-os com a morte e o sofrimento em caso de desobediência? No seu infinito poder, poderia ter inibido as suas dilectas criaturas de se arriscarem a tal teste. Poderia ter-lhes permitido serem sempre felizes e desconhecedores do mal. Porque não o fez?
E, na sua infinita misericórdia, porque não lhes perdoou o pecado cometido?
Faz-nos pensar que Deus não queria realmente que Adão e Eva vivessem eternamente no Paraíso.
Mas se assim foi, porque lhes mostrou o Eden?
Omnipotente como era, porque não os colocou logo na terra do sofrimento e do pecado, se essa era a sua vontade, como parece?
A tal árvore, uma macieira, segundo se fez constar ao longo de milénios, deveria ter sido, em minha opinião e mais apropriadamente, uma bananeira. Sim, porque foi uma verdadeira casca de banana aquilo que Deus colocou à frente de Adão e Eva!
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Mas o que mais me espanta nesta história é o papel do Adão. Quando questionado severamente por Deus sobre se tinha comido o fruto proibido, em vez de confessar a sua desobediência, procurou logo um bode expiatório a quem tentou endossar a sua responsabilidade. Ou seja, em lugar de assumir galhardamente o alegado pecado, desculpou-se dizendo que foi ela, a Eva, quem lhe deu a maçã a comer.
Parece que o estou a ver com ar ingénuo a dizer a Deus:
- Eu não tive culpa! Foi ela!
Típico de tantos e tantos homens actuais, afinal!
É por isso que, como homem, me envergonho do Adão!
É por isso que, sendo homem, admiro a Eva que não refreou o seu impulso de legítima curiosidade.
E que assumiu o que fez sem procurar culpar o fraco Adão!

Rui Felício
Blog «Encontro de Gerações do Bairro Norton de Matos»

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