Um dia, eu perdi o bater do meu coração.
Ele acordava, real, cheio, o batimento acelerava, nítido, ensurdecedor, quebrava o peito e fazia-se sentir lá fora, nos dias tolos, tolos, ternos. Depois, os dias passavam, percebia-se bater cada vez mais contra as paredes, contra a ausência de resposta que não lhe dava o impulso necessário para continuar; estupefacto, pálido, começava, lentamente, a abrandar. E voltava a despertar. E voltava a abrandar. Cada memória era cópia exacta da anterior, equação interminável que se recusava a retirar do peito. Um dia, abrandou até parar. E eu perdi o bater do meu coração.
Foi contigo, sim. Agora é azul, pasmado numa forma perfeita, inútil, varado de silêncio. Foi contigo, sim; tão depressa bateu que abrandar foi caminho longo e irreversível; talvez o caminho mais longo de todos, o mais demorado, o mais deserto. Fez frio, fez tanto frio no dia em que perdi o bater do meu coração; perdi-nos e já não nos encontro; perdi-nos, sim, mas ainda o tenho, está quieto, imóvel, mas está aqui.
Um dia, eu perdi o bater do meu coração mas não perdi o coração.
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Uma por dia tira a azia